sábado, 4 de março de 2017

O marketing no vale tudo dos bastidores da disputa política



Todos no Brasil e em Itabuna, em particular, sabem o que é a eleição de um poste e os resultados de uma empreitada de marketing  deste porte. Assim, baseado em fatos reais ocorridos na Bolívia no início deste terceiro milênio, ou seja, depois do ano 2000, “Especialista em Crise” mostra  a jornada de um grupo de assessores de marketing político norte-americanos em atividade durante uma eleição presidencial na Bolívia e que acabou num verdadeiro desastre, com o eleito renegando sua plataforma política nacionalista e aderindo à cartilha recessiva e antipopular imposta na época pelo FMI, gerando no país um clima de insatisfação e revolta ingredientes que depois levaram ao poder o populista Evo Morales alguns anos depois, que não entra nesta história.
Tudo começa num país em crise e com o candidato Pedro Castillo vendo naufragar o seu projeto político, patinhando  30 pontos atrás dos concorrentes nas pesquisas de opinião. Assim, para reverter a situação, a consultora política Jane Brodine (Sandra Bullock), também conhecida como Jane Calamidade (numa referência à uma aventureira americana do século XIX, pois ficou relegada a um segundo plano no mercado publicitário depois de uma fragorosa derrota numa eleição nos Estados Unidos) é convocada às pressas para tentar salvar uma candidatura considerada quase inviável.
Ao aceitar o convite, ela deixa a vida numa pacata comunidade rural americana,  longe da agitação dos centros urbanos, e descobre ao chegar na Bolívia, que terá que enfrentar novamente seu principal adversário, o inescrupuloso Pat Candy (Billy Bob Thornton), um especialista em armações ilimitadas  e ciladas mortais para os adversários políticos.
Jane começa a trabalhar a partir de um prisma: que a verdade é relativa em politica. Constata ainda, que Castillo não tem um perfil de um vencedor, pecando pela falta de carisma e porque nada funcionava na campanha, pois o candidato não era convincente, e ainda cobrava saídas da estretagista de campanha, que também não se ajustou à altitude boliviana, que provoca náuseas e um mal estar durante a fase de adaptação do organismo.
Ela também observou coisas meio estranhas na campanha. Para mudar o quadro desfavorável, ela foca a campanha em eixos proativos como trabalho e ações positivas do candidato, que recebe um ovo na cara de um manifestante contratado pelos adversários e ao revidar, desfere um soco na sua face. Como estratégia de resposta à agressão, ela constata que o candidato não é um bom ator, não é uma pessoa simpática e nem deve pedir desculpas pois foi vitima de uma armação.
O candidato tem uma reação positiva também num encontro com manifestantes que quebram o para-brisa do ônibus que viajava e Jane também identifica que a Bolivia vive a maior crise da sua história, apontando como saída Castillo uma ação proativa e um discurso nacionalista.
Num filme  que não explora a competência de seus atores principais, envolvidos num conflito permanente, tendo como pano de fundo uma disputa eleitoral, muito embora Sandra Bullock tenha sido cogitada para uma indicação ao Oscar de melhor atriz, o desenvolvimento das ações são relativamente lentos. O fato é que  o diretor David Gordon Green embora com um argumento bem definido e interessante não consegue explorar o cenário político ao redor do processo eleitoral e nem a sua essência dramática.
“Especialista em Crise” revela em essência  uma crise permanente desde o principio ao fim e mostra o crescimento gradual da candidatura de Castillo, revertendo a tendência para sua aniquilação. A própria Jane Bodine lembra que “isso não é uma eleição, mas uma crise e o que vendemos é uma crise”. E passa a vender uma imagem de um candidato paternal que tem de ser preocupado com a solução de problemas e ao mesmo tempo duro, inflexível, com os seus filhos.
Ela também parte do conceito maquiavélico de que se as forças inimigas estão juntas, a missão da campanha é separá-las e consegue reverter a situação da campanha colocando seu candidato num empate técnico nas pesquisas eleitorais. Ao acompanhar um debate dos candidatos, o seu conceito teórico, todos são marionetes e de que os fins justificam os meios.
No final. Castillo acaba vencendo uma  eleição com 23,5% dos votos, superando Rivera que ficou com 22,8% das opções e terceiro colocado com 21,9% dos votos. Com  a vitoria, ela constata que a campanha começa com grandes promessas., mas termina sem merda nenhuma. O seu candidato vai ao FMI para um acordo lesivo aos interesses do pais e na contramão do seu discurso, o que gera protestos e uma revolta da população, que entre em choque com a polícia.
Jane constata que numa campanha eleitoral e publicitária de vendas os resultados são similares, pois o estrategista convence as pessoas de adquirir coisas que não precisam, afinal as pessoas querem dinheiro, poder e o anel de latão, por isso acabam dando voltas sem fim e sem nenhum sentido. O filme termina com uma interrogação e abre um questionamento sobre a importância e o papel da propaganda num eleição, que pode ser de um poste ou de um candidato de carne e osso, coerente com a realidade de um projeto político e eleitoral com bases ideológicas ou não, mas quem sabe? (Kleber Torres)



FICHA TÉCNICA
Título Original: OurBrand is Crisis // Especialista em crise
Direção: David Gordon Green
Roteiro: Peter Straughan
Elenco: Sandra Bullock, Billy Bob Thornton, Joaquim de Almeida, Scoot McNairy, Anthony Mackie
Gênero: Comedia
Duração: 1h 48min
Ano: 2016