domingo, 26 de maio de 2019

O sentido e a essência de uma vida transitória e finita






Uma profunda reflexão sobre a vida com toda a sua complexidade, o amor e a morte, assim pode ser compreendido o  filme O Sentido do Fim (The Sense of an Ending), dirigido pelo cineasta indiano Ritesh Batra, que nos conta de forma humana  a história de  Tony Webster (Jim Broadbent), um homem de mais de 60 anos, que se define como um cavalheiro geriátrico protegido pela sua armadura brilhante,  capaz de reconstruir a sua vida na tentativa de apagar as memórias nem sempre agradáveis do passado. Ele, acaba inexoravelmente envolvido por lembranças dos  antigos amigos, das paixões do passado e pelo diário e cartas sobre um amigo que já morreu.
O filme começa com a voz em off de Toni Webster, também interpretado por Billy Howle, na juventude, o protagonista da história dizendo que “não tenho interesse nos meus dias de escola, nem tenho saudade deles. Mas me lembro do sexto ano.”
Tony também vive uma rotina de diária de  acordar às sete da manhã, ouvir um CD de música erudita, enquanto prepara seu café, um ritual que complementa com a leitura de jornais, onde publicou uma carta criticando aos motoristas de Londres. Depois, se dirige à sua loja de venda e conserto de máquinas fotográficas antigas, resultado de uma paixão da juventude pela fotografia, onde atende clientes e recebe uma carta que não abre porque tem de atender um outro compromisso imediato
Neste dia, ele vai acompanhar afilha para reunião de um grupo de gestantes lésbicas, que se preparam para a chegada do primeiro filho. Para que não perca esse novo compromisso, a filha lhe dá um  smartphone, talvez a ultima  esperança para fazer ingressar no século XXI um homem não afeito à redes sociais, à internet e que vive o seu mundo particular.
Construído a partir de um roteiro de Nick Payne, baseado no romance homônimo de Julian Barnes, o filme O Sentido do Fim mostra a  vida de Tony, inclusive lembrando a antiga namorada na juventude Verônica Ford (Freya Mavor) estalando os dedos numa sequencia rápida.
Tudo muda quando ele recebe uma carta que é parte de um diário sobre fatos da juventude,  e que incluem um  colega Adrian Finn (Joe Alwyn), que morre tragicamente. A carta tem como referência os anos 60 do século passado, incorporando o período quando Tony conheceu a ex-mulher Margareth Webster (Harriet Walter), mãe de sua única filha.
A carta de Sarah Ford (Emily Mortimer), mãe de Verônica inicia lembrando a  Tony, que  “acho que o certo  que fique com você o anexo desta missiva. Adrian sempre falou bem de você, e talvez você ache que essa é uma lembrança interessante, embora dolorosa, de algo passado há muito tempo.” Ela conta na carta, que também deixou algum dinheiro para Tony, para  concluir desejando tudo de bom, mesmo do além do túmulo,  destacando  que embora possa parecer estranho, os últimos meses de vida de Adrian foram felizes. 
Tony se dirige ao escritório de advocacia que havia mandado as duas correspondências para ele, para reclamar que a carta deixada por Sarah Ford fazia menção a um item anexado e  não lhe foi entregue. A advogada é reticente e diz que o material está com Verônica, interpretada na idade madura por Charlotte Rampling, executora do testamento e filha de Sarah Ford.
Verõnica, que  juventude lhe deu a primeira câmera Leica, ao ser procurada por Tony sobre as cartas e o diário,  marca um encontro na Ponte do Milênio, onde revela que queimou o referido diário. E entrega mais uma carta dele falando da vingança do tempo e da expectativa que Verônica e Adrian tivessem um filho, depois,  é seguida por ele até a sua casa, onde diz a Tony que ele veio encerrar um ciclo, mas não está disponível para atendê-lo.
Ao ser procurada por Tony, que fala de sua relação com Sara e Verônica,  bem como sobre diário incinerado, sua ex-mulher Margareth  o acusa de tentar construir um altar para uma paixão da juventude e que agora as suas atenções deveriam estar e voltadas para a  filha grávida e o nascimento do neto. Ele pede desculpas e reconhece os erros cometidos.
O filme nos  ensina  que quando a vida passa, menos pessoas sobram ao nosso redor. A outra lição que fica é que entre os ganhos as perdas  inerentes da vida, resta a capacidade de sobrevivência e a resiliência, mas que nos comove quando tentamos às vezes inutilmente olhar pelo retrovisor.(Kleber Torres)
Ficha técnica: 

Título : O Sentido do Fim(The Sense of an Ending)
Direção :  Ritesh Batra
Roteiro : Nick Payne baseado no romance homônimo de Julian Barnes, Tony
Elenco : Jim Broadbent. Billy Howle, Charlotte Rampling, Freya Mavor Harriet Walter, Michelle Dockery, Emily Mortimer, Matthew Goode, James Wilby, Edward Holcroft, Joe Alwyn, Jack Loxton, Peter Wight, Timothy Innes, Hilton McRae, Andrew Buckley e Nick Mohammed
Fotografia ; Christopher Ross
Música ; Max Richter
Inglaterra
 2017
Cor, 108 minutos

domingo, 19 de maio de 2019

Um desejo com gosto de sangue e de morte




 

 

Com nova roupagem e os mesmos ingredientes de sangue e violência, Dead Wish (Desejo de Matar) surge com um remake 44 anos após o lançamento do  primeiro de uma série com sequência de outros quatro filmes: Dead Wish 2, Dead WishIII, Dead Wish IV – Crackdolmes e Dead Wish V – the Face of Death,  que atraíram um público cativo durante um período de duas décadas, estrelados por Charles Bronson, dirigido por Michael Winner, no papel de Paul  Kersey, um arquiteto que se transforma num justiceiro   depois do assassinato de sua mulher  e do estupro da sua filha por assaltantes.
Na nova versão de 2017, depois de ter sua casa invadida por ladrões e a sua mulher Lucy (Elisabeth Shue) assassinada por bandidos, além da filha Jordan (Camila Morrone) gravemente ferida, o cirurgião Paul Kersey, um profissional de saúde bem sucedido, agora interpretado por Bruce Willis, passa a acompanhar a polícia nas investigações infrutíferas para tentar capturar os criminosos, o que o leva a pensar numa forma de vingança devido à lentidão da ação policial.
Ao  perceber que a polícia jamais encontraria os assassinos e que os casos de roubos e assassinatos faziam parte de uma extensa lista de casos insolúveis em Chicago, uma cidade muito violenta segundo os comentários recorrentes na imprensa local referenciada no filme, ele começa a traçar uma estratégia de vingança. Primeiro, indo a uma casa de armas e munições, depois, surrupiando a Glock de um marginal ferido. Assim, ele passa a usar a arma  para  combater a assaltos no bairro onde reside, passando ser reconhecido como justiceiro encapuzado que age como um ceifador de almas.
Posteriormente, ao atender a um dos ladrões mortalmente ferido no hospital onde trabalhava, ele recupera o seu relógio roubado durante o assalto e usando o seu celular,  passa a caçar cada um dos integrantes da quadrilha e no final monta um álibi para escapar das suspeitas dos policiais que o investigavam como um justiceiro em ação numa das maiores e violentas cidades americanas.
O remake dirigido por Eli Roth, que assinou O Albergue e trabalhou com Quentin Tarantino em Bastardos Inglórios (2009), é  atualizado agora a partir de várias sequências com os  registros dos atos de violência que viralizaram via smartphone nas redes sociais, em paralelo ao uso de imagens estáticas que se transformam em memes. Também recupera diálogos do grupo no Whatzapp.
Primando pela ação e pela violência, Dead Wish inclui uma gama de cenas  de ação marcadas pelos tiros em profusão, cirurgias a seco e sem anestesia ou até com o uso de óleo de freio nos ferimentos provocados pelo cirurgião na tentativa de chegar aos integrantes da quadrilha que matou a sua mulher e feriu a sua filha, tudo complementado com o esmagamento de um dos assassinos que acaba  transformado  em uma massa informe de miolos e sangue espalhados no chão de uma oficina mecânica, o que explica o título e irrita os críticos da estética da violência pela violência cada vez mais banalizada e globalizada.(Kleber Torres)



Ficha técnica


Título:  Desejo de Matar (Dead Wish)
Direção : Eli Roth
Roteiro: Scott Alexander, Michael Ferris e Larry Karaszewski

Elenco :  Bruce Willis, Vincent D'Onofrio, Elisabeth Shue,  Camila Morrone, Jack Kesy, Beau Knapp, Kirby Bliss Blanton, Mike Epps, Len Cariou, Kimberly Elise, Ronnie Gene Blevins, Ian Matthews e Nathaly Thibault.

Música: Ludwig Göransson
118 minutos
EUA

sábado, 18 de maio de 2019

Uma tragédia muito além da dimensão do terror




A HBO está exibindo a série Chernobyl, com cinco episódios sobre o grave acidente com uma usina nuclear na Ucrânia,  em 1986 e de impacto global em função da emissão de partículas  radioativas na atmosfera, que além da transmissão na TV, também ficarão disponíveis no aplicativo de streaming HBO Go. A série é comandada pelo diretor sueco Johan Renck, que dirigiu anteriormente três episódios de Breaking Bad, um episódio de Walking Dead   e outro de Halt and Catch Fire.
O ator Jared Harris (Mad MenThe Terror) interpreta Valery Legasov, cientista indicado para investigar  a causa do acidente logo após o desastre, considerado um segredo de estado pelo governo russo, que tentou abafar o caso evitando inicialmente fazer a retirada da população da área do incidente e até mesmo controlando o fluxo de informações, inclusive cortando os canais de telefonia na comunidade afetada pelo superaquecimento e explosão do reator nuclear, provocando a morte de vários técnicos que trabalhavam na usina nuclear e afetando desde socorristas, bombeiros, militares e  até a própria população atraída pela visão dantesca das imagens multicoloridas da explosão de energia atômica. 
Vale ainda o papel de Paul Ritter (Anatoly Dyatlov), o responsável pela usina, que se recusava a aceitar que houve uma explosão do núcleo, porque achava que isso seria impossível em função da segurança do sistema de geração de energia atômica. O elenco é integrado ainda por Stellan Skarsgård (Thor) interpretando Boris Shcherbina, membro de alto escalão do conselho de energia da União Soviética e apontado como chefe da comissão de Chernobyl pouco depois do acidente, quando o governo ainda não sabia da explosão do reator e procurava encobrir a dimensão real do acidente. 
Emily Watson é na série a física nuclear Ulana Khomyuk, a quem cabe resolver o mistério de como o desastre aconteceu em função de falhas do sistema e de erros humanos no que seria uma aparente operação de rotina e ao mesmo tempo criar protocolos de segurança prevenindo assim para que uma tragédia como esta não se repita.
A série que começa com uma reflexão sobre a questão da verdade e a manipulação política da informação, mas também revela o que seria o pior desastre do gênero na história, com milhares de pessoas expostas à nuvem radioativa, que contaminou parte da Europa, além de resultar no nascimento de crianças deformadas e mutantes.
Segundo dados iniciais,  31 pessoas morreram nos primeiros três meses após o acidente, mas milhares de vítimas pereceram nos anos  seguintes de doenças relacionadas à exposição e aos efeitos nocivos da radiação, que são sentidos até hoje pelos sobreviventes, enquanto as áreas vizinhas à usina continuam desabitadas e sob monitoramento.
Chernobyl tem como foco as mentiras e fake-news divulgadas pelo governo da União Soviética, liderado por Mikhail Gorbachev, que tentou sustentar -apesar das evidências contrárias - por algum tempo que tudo não passava de um simples incêndio, que colocou bombeiros e técnicos da usina nuclear diretamente em contato com o material radioativo. A série com cores sombrias mistura drama, com ingredientes de um thriller político e de horror com a dimensão de uma tragédia global, que ganhou dimensão em escala planetária. Vale a pena conferir. (Kleber Torres)