quinta-feira, 25 de junho de 2020

Uma chuva de estrelas numa noite muito mais que especial


“Boa noite para todos” celebra os 70 anos do cantor e trompetista  Louis Armstrong, considerado um ícone  e a própria personificação do jazz, uma figura tão importante quanto a de Duke Ellington na história desta rica e criativa manifestação artístico-musical originária de comunidades de Nova Orleans. O filme realizado em 1971, passou em 2008 por uma restauração digital produzida e dirigida por outras duas lendas do mundo do jazz George Wein e Sidney J. Stiber, teve como cenário especial o tradicional Festival de Jazz de Newport.

A histórica celebração musical reúne o astro do jazz, com sua simplicidade e seu humor, cuidando dos preparativos e ensaiando para a apresentação da noite com seus convidados. O filme narrado pelo próprio músico, passeia por grandes sucessos como “What a Wonderful World” , “Blueberry Hills”,  e “Way down yonder in New Orleans”, com a participação de lendas como Mahalia Jackson, num show a parte e que fechou o espetáculo,  desfilando musicalmente ao lado de Dizzie Gillespie,  Jimmy Owens (o mais jovem músico do grupo), Bobby Hackett, Wild Bill Davison e Ray Nance, junto com as bandas Preservation Hall Jazz Band e da Eureka Brass.

Imperdível a exibição Dizzie Gillespie, que fala da dimensão de Louis Daniel Armstrong para a história do jazz e sua contribuição à música, inclusive com a sua técnica inigualável de scat, o famoso improviso vocal com vocábulos inventados, que o imita de forma magistral em “I'm confessing”.

O neto de escravos que foi abandonado pelo pai e foi entregador de jornais na juventude, mas hoje é considerado um dos mais poderosos e influentes  músicos de todos os tempos, com o seu trompete e voz inconfundível, também participou ativamente  das celebrações confraternizando com os músicos e os fãs que foram para Newport, um tradicional festival realizado em agosto de cada ano desde 1954 e que este ano 2020, em função da pandemia do novo coronavírus, foi cancelado.

Entre as apresentações de clássicos que prevalecem ao longo do tempo  estão “Hello Dolly”, “I Want a Little Girl”, “Thanks a Million”, “Way Down Yonder in New Orleans”, “I'm Confessin'”, “Them There Eyes”, “Nobody Knows the Trouble I've Seen”, “I'm in the Market for You”, “Ain't Misbehavin'”, “When It's Sleepy Time Down South”, “Pennies from Heaven”, “Blueberry Hill”, “ “Mack the Knife”, e a imortal“What a Wonderful World”,e  Armstrong, nos intervalos fazia comentários e falou da sua relação visceral com a música, lembrando que “se o disco é bom e se tiver rítmo, eu compro.”  

Na apresentação de Mahalia Jackson, que interpretou entre outras músicas “Let There Be Peace on Earth”, o que relembra a sua cidade natal e “Come On Children Let's Sing”, Armstrong fez uma ligação entre sua música gospel – uma das formas do jazz que também se manifesta no blues, no soul e até no regtime um precursor do universo jazzístico  - e as igrejas como marco de contrição e de fé. Como tudo é música,  ele cantarolou “Let it be”, dos Beatles, que tinha ouvido recentemente e concluiu com sua sabedoria: “esta música é religiosa e é de igreja por excelência”, o que foi dito por quem entende de música e sabe que este é um dos caminhos para se chegar a Deus.(Kleber Torres)

 

Ficha Técnica:

Título :  “Louis Armstrong : Goog evening, everybody”  Louis Armstrong :“Boa noite para todos”

Direção : George Wein e Sidney J. Stiber

Elenco : Louis Armstrong, Bobbie Hackert, Ray Nance, Jimmy Owen, Wild Bill Davidson, Mahalia Jackson, George Win, Joe Newman, Dizzie Gillespie, Tyree Gleen e Oliver Jack

Ano: 1971


domingo, 21 de junho de 2020

Uma parceria de mais de quatro décadas na história no cinema


 

 

 

Em cerca de 25 minutos, o documentário John  Williams &  Steven Spielberg – A aventura continua (John Williams &  Steven Spielberg - the adventure continues), dirigido por Laurent Bouzereau, revela em cores e música o resultado de uma das mais longas e produtivas parcerias da história do cinema,  que começou em 1974 e se prolonga ao longo dos últimos 46 anos, com a conquista de diversos Óscares e faturamento de mais de US$ 1 bilhão, somente nas bilheterias dos cinemas.

A história começa no filme Louca Escapada (The Sugarland Express), segundo filme de Spielberg, então um jovem com pouco mais de 20 anos na época. O fato é que ao longo do tempo, apenas três filmes do Spielberg não tiveram a trilha sonora assinada por  John Williams: A Cor PúrpuraPonte de Espiões e Jogador Nº1, um regente vigoroso e um compositor altamente criativo, com passagem pelo universo do jazz.

O documentário, realizado em 2017, envolve um período de 43 anos da dupla e inclui entrevistas com Steven Spielberg e John Williams, falando sobre uma parceria que  durante os 90 anos da história do cinema sonoro, registra  um dos poucos e mais longos casos em que um diretor e um compositor formaram uma associação tão proveitosa e criativa por tantos anos. Esta associação teve como resultado  uma série de partituras consideradas clássicas, superando a prova inexorável do tempo, o que as torna sempre atuais e com impacto na cultura popular..

A parceria  Steven Spielberg e John Williams se destaca em dois pontos: pela criatividade e pela  riqueza, o que fica evidenciado na música de Louca Escapada, em que há uma fusão de jazz e country music. O documentário reuniu a Orquestra Boston Pops, dirigida desde 1980 por Williams, que começou sua trajetória como pianista de jazz, além de corais que participaram das gravações inclusive da Lista de Schindler’s (Schindler's List), um filme sobre o drama do Holocausto.

O destaque desta parceria é que ela vai desde a trilha para Tubarão, com uma espécie telegrama sonoro para o espectador, que quase não vê o monstro assassino,  até a criativa saudação alienígena através de cinco notas de Encontros Imediatos de terceiro grau (Close Encounters of the Third Kind).

O documentário transita transversal  e universal por diversos filmes com uma variedade de tramas dirigidas por  Spielberg, um dos mais influentes cineastas, como  a marcha de Caçadores da Arca Perdida (Raiders of the Lost Ark) e os temas  emocionantes associados às música que Williams compôs  para mais de duas dezenas de projetos do cineasta e que se inscrevem na rica história do cinema, a qual pode ser lida não apenas em imagens e planos sequenciais, como também em sons que ficaram na nossa memória e serão lembrados para sempre.(Kleber Torres)

 

Ficha Técnica:

 

Titulo :  John Williams &  Steven Spielberg - the adventure continues (John  Williams &  Steven Spielberg – A aventura continua)

Direção : Laurent Bouzareau

Elenco :  John Williams e  Steven Spielberg

Produção : 2017

Duração : 25 minutos


sábado, 20 de junho de 2020

Um cult movie sobre o amor e a morte em preto e branco

 


 

Considerado uma espécie de cult movie, o filme Killer’s kiss (A morte passou por perto), produzido em 1955,  foi o segundo trabalho do genial Stanley Kubrick, que cuidou com esmero aos 26 anos  do roteiro, fotografia, produção e direção de uma obra autoral com um história que mistura drama policial e suspense, embutidos numa história de amor. Um dos destaques do filme ficam para a fotografia e as sequências das lutas de boxe, além  do enfrentamento de Davey Gordon (Jamie Smith) com o seu antagonista, o gangster Vincent Rapallo (Frank Silvera).

A morte passou por perto conta a história do lutador de box  Davey Gordon,  que depois de derrotado na luta mais importante da sua carreira pensa em mudar de profissão e acaba se apaixonando pela sua vizinha, Glória Price (Irene Kane), uma dançarina explorada e assediada pelo seu patrão Vincente Rapalllo, que explora uma casa noturna similar à carioca Estudantina, uma antiga gafieira carioca, que ficava na praça Tiradentes, em que o cliente pagava em cartões perfurados por cada dança.

Tudo se complica quando ela pede as contas e deixa Vincent Rapallo para ficar com o lutador, que tem planos para mudar de cidade e se reinventar profissionalmente. Quando o casal se prepara deixar a cidade, Rapallo, enciumado, manda seus capangas para matar Gordon, mas numa trapalhada os sicários acabam eliminando por engano ao empresário de Gordon, que foi visto ao lado do Glória na porta da casa noturna enquanto esperava o amigo.

Depois do crime, os capangas sequestram a jovem e a levam para um esconderijo, enquanto aguardam seu patrão, que faz novas ameaças à dançarina que teve uma vida trágica, pois a irmã casada com um milionário se suicidou e seu pai, um homem muito doente, acabou morrendo após a morte da filha. Gordon, que seguiu o mafioso, vai  até o local onde a jovem é mantida em cativeiro disposto a libertá-la e ele e seu antagonista entram numa disputa mortal.(Kleber Torres)

 

Ficha Técnica

 

Título: Killer’s Kiss (A morte passou por perto)

Direção e cinematografia : Stanley Kubrick

Elenco : Frank Silvera, Jamie Smith, Irene Kane, Jerry Jarret, Mike Dana e Felici Orlandi

Roteiro: Stanley Kubrick e Howard Sackler

Produção: Stanley Kubrick e Morris Bousel

Música: Gerald Fried

Estados Unidos

1955 •  pb •  67 min

Idioma          inglês


sábado, 13 de junho de 2020

Uma estética de violência e caos durante um surto virótico

 

 

Em tempos de pandemia provocada pelo novo coronavírus, o filme Mayhem (Um dia de caos), dirigido por  Joe Lynch e rodado em 2017, nos leva a uma reflexão sobre o caos e a violência desmedida. Tudo tem como base a ocorrência de um surto virótico temporário no edifício sede de uma empresa de prestação de serviços jurídicos na área corporativa, onde o  advogado Derek Cho (Steven Yeun) acaba injustamente demitido depois de uma armação  preparada pelo seu chefe (Steven Brand), um profissional sem escrúpulos, usuário de cocaína e um homem de métodos deveras heterodoxos na consecução dos seus objetivos.

No mesmo momento em que Derek Cho está deixando a sede da empresa, levando a caixa com os seus teréns e escoltado por seguranças,  um vírus capaz de fazer as pessoas externarem seus impulsos mais selvagens e manifestarem seus planos recônditos infesta o edifício. Enquanto ele está retido  no prédio em quarentena,  é forçado a lutar ferozmente com unhas e dentes não só pelo emprego, mas também pela sua vida.

Nesta luta, ele enfrenta e estraçalha literalmente  jagunços a serviço do chefe todo poderoso no porão do edifício e depois, se associa com uma colega de escritório Melanie Cross (Samara Weaving) numa vingança que envolve a tomada cartões de prepostos hierárquicos dos níveis dois e três da empresa para poder ter acesso ao seguro aos andares superiores do prédio onde funciona a sua diretoria executiva.

Para alcançar o escritório  do chefe no topo do edifício, onde o mesmo se reúne com assessores  submissos ocupando cargos em função de uma obediência cega, são registradas lutas à base de socos ingleses e ponta pés em profusão. Também são registradas mortes com serras elétricas portáteis ou com o suporte máquinas pneumáticas grampeadoras de pregos, numa sequência cabível nos filmes do mestre Quentin Tarantino.

Mas o que é importante no caso de ´”Um dia de caos” não é a necessidade de um isolamento social para conter a virose – o que é feito com o cerco do edifício  pela polícia em conjunto com autoridades sanitárias com suas capas protetoras e máscaras parecendo astronautas -, mas a lição do personagem central de que a custa de sangue, suor e muitos gritos, pode-se conquistar postos numa empresa ou livrar-se de um chefe autoritário depois de provocar uma gama de mortes em série e imprevistas, além do mais, fica implícito que para se conseguir a realização de desejos é preciso muito esforço, foco nos objetivos e definição das metas a serem atingidas, o que pode ser possível na base do vale tudo ou fazendo vigorar o Leviatã, ou seja, dando amplitude à luta hobbesiana de todos contra todos.   (Kleber Torres)

 

 

 

Ficha técnica:

 

Título: Um dia de caos (Mayhen)

Direção: Joe Lynch

Roteiro: Matias Caruso

Elenco : Samara Weaving, Steven Yeun, Dallas Roberts, Steven Brand

Música : Steve Moore

Gênero : Ação e Terror

Origem: Estados Unidos

86 minutos

2017


domingo, 7 de junho de 2020

A história de um serial killer com sotaque genuinamente brasileiro

 


 

Baseado no livro homônimo de Jô Soares, que une personagens da história do Brasil e de ficção,  a exemplo da dupla Sherlock Holmes e seu assessor Watson, criações do imortal Sir Conan Doyle,  o filme Xangô de Baker Street tem como cenário Rio de Janeiro, nos idos 1886, quando a diva francesa Sarah Bernhardt (Maria de Medeiros) se apresenta pela primeira vez no Brasil, país que tinha como referência maior a cultura francesa.

O filme trata com humor e suspense dois casos policiais: o roubo do último violino Stradivarius da baronesa Maria Luíza (Cláudia Abreu) e uma série de mortes de mulheres com cortes no pescoço, orelhas decepadas e para aumentar o mistério, com cordas de violino nos pelos pubianos. Ele também resgata na ficção e com humor fatos como a criação da caipirinha, além de falar de temas complexos como o uso da maconha e da cocaína, este último, na época era um produto recomendado por Sigmund Freud, pai da psicanálise, que antes de condenar o seu uso, a considerava um remédio.

No seu camarim, Sarah sugere que o imperador D.Pedro II (Cláudio Marzo) convide o detetive Sherlock Holmes (Joaquim de Almeida) para investigar o caso,  uma sugestão prontamente acatada. Além de investigar o roubo do violino, o detetive inglês se associa ao delegado Mello Pimenta (Marco Nanini) na busca pistas para capturar o perigoso serial killer. De certa forma os dois casos têm uma profunda relação entre si e quem sabe, com Jack, o Estripador, que poderia ser o tema de um novo filme

Na perseguição ao assassino Sherlock come feijoada e  com vatapá o que lhe causou uma dor de barriga, conquista uma atriz brasileira, com quem faz amor e acaba detido por atentado ao pudor no Jardim Botânico e até  frequenta a um terreiro onde descobre que ele é filho de Xangô. O seu fiel escudeiro, Watson (Anthony O'Donnell) incorpora uma entidade e dá pistas do assassino a quem identifica como Oluparun, uma palavra em iorubá, que significa o destruidor.

A filme mostra em cor sépia, usado para filmes de época, o Rio de Janeiro do final do século XIX,   com uma nobreza subserviente, cheia de rapapés e uma turma de boêmios cariocas, entre os quais figuravam o poeta Olavo Bilac, o abolicionista José do Patrocínio, a musicista Chiquinha Gonzaga e o médico Nina Rodrigues, eugenista e fundador da antropologia criminal brasileira.(Kleber Torres) 

 

Ficha técnica:

 

Título : Xango de Baker Street

Diretor : Miguel Faria Júnior

Roteiro : Marcos Bernstein a partir do livro homônimo de Jô Soares e de personagens do  Sir Arthur Conan Doyle

Elenco : Joaquim de Almeida, Anthony O’Donnell,Maria de Medeiros, Cláudia Abreu, Cláudio Marzo, Caco Ciocler, Marco Nanini e Jô Soares

Música : Edu Lobo

Gênero : Comédia, Policial e Suspense

Nacionalidade : Brasil e Portugal

 


sábado, 6 de junho de 2020

Uma nota azul que revolucionou o jazz e a música do nosso tempo


Blue Note Records: Beyond The Notes é um documentário excelente, com 86 minutos de duração,  sobre a história rica de uma gravadora formada na cidade de Nova York em 1939, por dois refugiados judeus alemães que escaparam a sanha assina nazista: Lion e Francis Wolff. Ela se tornou uma referência e uma das mais importantes gravadoras de toda a história do jazz, somando mais de dois mil títulos com os maiores nomes do universo jazzístico e uma seleta lista de pelo menos 900 discos e álbuns considerados clássicos.

A Blue Note Records, cujo nome teve origem a partir de uma nota musical oriunda  das escalas usadas nas velhas canções de trabalho praticadas dos povos afro-americanos, uma característica musical que imprimiu um caráter lamentatório ao blues, também  revelou várias estrelas do jazz e abrigou  celebridades como John Coltrane, Miles Davis, Thelonious Monk – então um pianista desconhecido -, Art Blakey passando por Herbie Hancock e Norah Jones, que  passaram pela Blue Note.

Além de resgatar uma história que percorreu os limites do tempo, o filme reúne músicos como Herbie Hancock e Wayne Shorter que se uniram com uma nova geração de artistas criativos da Blue Note, como Robert Glasper e Ambrose Akinmusire, para gravar o álbum “All-Stars”. O projeto provocou um conjunto de reflexões que nos remetem ao legado passado da  Blue Note e que serve de referência para a construção do futuro, servindo de base e motivo para um filme para quem gosta e quer conhecer a história do jazz.

O filme mostra ainda, que além da efetiva contribuição musical, artística e histórica, a gravadora também foi palco de ideias revolucionárias, como a luta de músicos negros que desejavam ser escutados, ocupando o seu espaço e o conflito entre arte e comércio, abrindo espaço a lançamentos que não apenas inovaram  o mundo do jazz, mas deixaram uma marca na música do século XX e XXI. Em termos de arte, o grafismo das capas da gravadora hoje integrada à Universal também eram uma marca registrada da Blue Note unindo fotografia com composições inovadoras sem o recurso das tecnologias digitais. (Kleber Torres)

 

Ficha técnica

Título: Blue Note Records: Beyond the notes

Direção: Sophie Huber

Elenco : John Griffin, Herbie Hancock, André Previn,Wayne Shorter,Carlos Santana, Robert Glasper  

Gênero : Documentário

Nacionalidade : Estados Unidos e Suiça

Duração : 86 minutos

2018