sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

A história de uma entrevista que virou filme sobre o poder

 


 


 

No momento em que o ex-metalúrgico Luis Inácio Lula da Silva, que esteve preso num processo de corrupção e tenta voltar pela terceira vez à presidência da República, um filme interessante e que serve de espelho para a sua trajetória política é Walesa, de 2012, dirigido por Andrzej Wajda. O filme tem como base narrativa entrevistas do ex-presidente polonês  Lech Walesa no período de 1990 a 1995, à jornalista italiana Oriana Fallacci  interpretada pela atriz Maria Rosaria Omaggio, famosa pela cobertura de guerras e revoluções, além de autora de entrevistas antológicas com vários líderes mundiais e que lhe deram projeção internacional. 

Lech Walesa (Robert Wieckiewicz) aparece como um político tarimbado, que começou a vida como eletricista e empregado de um estaleiro de  Gdansk, propõe à entrevistada uma série de perguntas para saber se  a entrevistas seria positiva ou negativa para a imagem da sua pessoa. O filme tem como cenário desde os anos 70 com a Polônia conflagrada em um clima de revolta da população irritada com o aumento de 30% no aumento dos preços da cesta básica e dos serviços públicos.

O filme também traça à trajetória de Walesa, que se tornou líder do partido Solidariedade e  ganhador do Prêmio Nobel da Paz. Tudo começa quando ele sai da sua casa em 1971, para pegar um carro de bebê para o filho e acaba detido levando panfletos no meio de uma série de confrontos entre a população e a policia. O operário acaba detido e forçado a colaborar como informante com as forças de segurança.

Como eletricista ele acaba  se revelando como uma liderança entre os operários ao cobrar máscaras de proteção para os trabalhadores do porto e do estaleiro. Posteriormente, numa reunião do partido comunista que controlava o país, ele se  manifesta em defesa dos trabalhadores, depois promete ligar a eletricidade para um amigo que estava sem luz em casa, mas acabou demitido.

Ao ser questionado por Oriana Fallaci sobre quem o ensinou a agir, Walesa declarou: “sou um homem com muita raiva. E preciso viver com raiva.” O fato é que desempregado, ele acabou precisando procurar um novo emprego, arruma vários bicos  e recebe panfletos na rua,  que o levam ao comitê dos trabalhadores  onde criticou o estágio da luta por direitos da categoria por considerar em seu discurso que “as intenções são boas, mas o resto é lixo.”

O filme revela que a policia vai à casa de Walesa no mesmo dia da visita do Papa João XXIII ao país, em 2 de junho de 1971, quando ele é novamente preso mais uma vez e declara aos seus interrogadores : “antes eu falava porque não tinha escolha” e se recusa a colaborar com os órgãos de segurança afirmando também que não iria abandonar a sua filiação ao sindicato. Na entrevista, ele declara à jornalista italiana que foi preso várias vezes e que a prisão era um bom lugar para pensar.

Pai de seis filhos, ele confessa à repórter que a sua mulher não apenas suportou as suas detenções, como o ajudou muito contirbuindo na sua escalada política e o apoiando nas demissões que teve de enfrentar, sempre procurando trabalhos alternativos, inclusive trabalhando no conserto de carros.  Contou ainda que em 18 de dezembro de 1979, participou de um comício onde falou da sua demissão, sendo preso mais uma vez pelo serviço secreto polonês, no momento em que o país vivia uma nova crise de desabastecimento.

Ao sair da prisão, ele emerge como um dos lideres do greve nos estaleiros, em 14 de agosto de 1980, que começou com uma grade mobilização, mas sem  a presença de Walesa, que chega após  a eclosão do movimento, depois de escapar a um cerco policial pulando um muro. Antes de sair da sua casa, ele havia entregue à mulher o relógio e aliança, com a recomendação para que os colocasse à venda caso ele não voltasse.

Nesta época, os grevistas reivindicavam aumento de salário para dois mil ztoty  e redmissão dos trabalhadores demitidos, além da construção de um monumento aos trabalhadores mortos na greve de 1970. Para Walesa, “eles aceitaram a nossas exigências. Mas depois alegaram que não mais aceitavam as negociações, nós estávamos em greve por solidariedade”.  Com a população da cidade aderindo à paralisação do estaleiro e do porto, os grevistas ampliaram a pauta de reivindicação propondo a realização de eleições livres e a lista passou a contar com nada menos que 21 exigências.

Num outro questionamento, Oriana Fallaci pergunta a Walesa o que significa ser líder  e ele destaca entre valores de liderança: “ser destemido e não se dobrar, além do mais, sei o que falar com as massas”. Ele desatacou que o sucesso do solidariedade estava no apoio de artistas e intelectuais, enquanto os russos pressionavam as autoridades polonesas para a repressão aos grevistas, no momento em que a paralidação ganhava adesões em todo o pais”

A greve termina em 31 de agosto de 1980 e o filme mostra Walesa sendo carregado nos braços pelos trabalhadores. Ele comemora a anistia e a soltura dos presos políticos e declara que “a vitória não foi minha, mas da união de todos.” Numa outra entrevista em sua casa, deitado na cama, o líder polonês diz à jornalista que “não me adapto á regras do jogo”, enquanto sua mulher colocava visitas e sindicalistas para fora de casa.

Walesa também confessa na entrevista que serviu para o roteiro do filme, que não lia livros, comprou até alguns, mas não lia mais que cinco páginas. Em 13 de dezmebro de 1981, o secretário do partido e o prefeito de Gdansk vão à casa de Lech Walesa informando que o governo havia decretado lei marcial. Assim, ele volta à militância sindical e diz num encontro com policiais que o abordaram com ameaças: “um dia vocês ainda vão me pedir trabalho”.

O líder do Solidariedade contou ainda na entrevista, que foi sequestrado pelos comunistas   e em 11 maio de 1982  condenado à 18 anos de prisão, mas acabou convidado a ir para a televisão para tentar encerrar  uma nova paralisação dos trabalhadores. Ele fala da repressão politica depois da ocupação da Polônia pela União Soviética,  da sua participação como colaborador do regime e  das mudanças com a  morte de Leonid Brejnev, ex-secretário geral do partido comunista soviético em 10 de novembro de 1982. Bem como da  festa com a soltura de Walesa, o qual declara a Oriana Fallaci que “o país está prestes a explodir e eu sei mudar isso com calma e paciência.”

No mais tudo culmina com as eleições que o levaram à presidência da Polônia em 1989 e no mesmo ano, em 9 de novembro. cai o muro de Berlim, num filme que revela uma história baseada em fatos reais, e como a voz e a ação de um homem ganharam repercussão num mundo globalizado e em constante mudança.(Kleber Torres)