domingo, 19 de junho de 2022

As diversas faces virtuais no crime ponto com



 

Construído no formato de documentário com seis episódios exibidos inicialmente em 2019 e depois reprisados posteriormente através do canal Investigação Discovery (ID), a série Crime.com,  revela para o espectador golpes e crimes digitais inimagináveis que aconteceram na internet brasileira, com repercussão e desdobramentos inclusive em outros países. Cada caso é complementado com depoimentos de pessoas envolvidas em cada um dos casos apresentados.

Cada episódio, com 45  minutos de duração  em média, envolve três casos diferentes, narrados pelo ator e locutor Luiz Guilherme Deliberador Favati, o qual explica didaticamente aspectos fundamentais dos crimes cometidos com a ajuda dos recursos e das tecnologias digitais, mas com impacto na vida real das vítimas. Uma preocupação evidenciada no projeto está em revelar  como pensam e atuam os na prática  os autores de fraudes digitais seja através de píshing, uma técnica de engenharia social usada para enganar as vítimas e obter informações pessoais sobre as mesmas, com acesso a informações sobre senhas, arquivos pessoais, cartões de crédito utilizados e depósitos bancários, ou mesmo de outras modalidades operacionais.

 "Crimes.com" tem também como proposta evidenciar a  vulnerabilidade das pessoas ou de empresas   aos golpes virtuais através do acesso à rede mundial de computadores ou mesmo por telefone. Tudo isto é facilitado pela crescente  exposição individual através às muitas plataformas digitais, as quais sempre são monitoradas por criminosos com acesso ao crescente uso de aplicativos  usados largamente nos dias de hoje para diversas finalidades.

De forma complementar,  série inclui ainda depoimentos de personagens envolvidos nos casos, como delegados, investigadores, advogados, técnicos, consultores e vítimas que aparecem em cada história, em que são apresentadas as reencenações dos crimes e fraudes. Estes ingredientes conferem maior dramaticidade e veracidade à série, que deveria ser ampliada no futuro, porque as modalidades de crimes se multiplicam e se desdobram em inovações como, por exemplo, o surgimento de quadrilhas especializadas no roubo através de transferências de recursos pelo pix ou oferecendo lucros mirabolantes através da operação com criptomoedas.

Uma das histórias da série teve como referência a atuação de um dos maiores hackers do Brasil, que se apresenta como Daniel Nascimento e foi cooptado por um outro operador identificado como Fênix, o qual usava carros de luxo e evidenciava um elevado padrão de vida. Os dois invadiam computadores através do sistema de pishing e ganhavam dinheiro para si e para clientes beneficiados pelas fraudes. O caso foi investigado pela Polícia Federal que acabou chegando aos operadores do golpe e hoje, o jovem hacker teria abandonado as atividades criminosas,  passando a operar do outro lado do balcão. Agora, atua no mercado como consultor na área de cibersegurança.

O segundo caso mostrado pelo Investigação Discovery foi uma fraude contra uma empresa produtora de aplicativos, que tinha seus produtos copiados integralmente por uma concorrente e lançado antes da desenvolvedora, com mudanças apenas nas cores dos apps. O caso também foi investigado pela polícia, consultores e advogados da empresa, que começaram apurando as formas possíveis de vazamentos das informações que deveriam ser sigilosas.

Os policiais começaram primeiramente  a monitorar os equipamentos da empresa  e as rotinas dos servidores, os quais foram submetidos a perícia. Gustavo Batistuzzo conta que as pistas apontavam inicialmente para o diretor de tecnologia de informação da empresa, Sérgio Andrade, e, assim, foi solicitado em paralelo um mandado de busca e apreensão nos computadores e telefones dos trabalhadores da empresa.

Resultado: foi descoberto que todos os sócios da suposta empresa concorrente, que teve a venda dos softwares piratas suspensos pela Justiça, eram empregados da empresa lesada nos seus direitos autorais e  de propriedade tecnológica.

O terceiro caso começa com um suposto sequestro de um homem, que em seguida corre sozinho numa rua com ferimentos na testa e hematomas no corpo. Ele cai no passeio e é socorrido desmaiado. A vítima é nada menos que um empresário bem sucedido, que comandava um Clube de Empreendedorismo, especializado em investir no mercado de apostas esportivas no mercado internacional e que funcionava em realidade como uma pirâmide financeira.

A policia apurou que o golpe movimentou mais de R$  200 milhões. Uma das vitimas tinha R$ 77 mil aplicados  na conta de gerenciamento do saldo digital de investimento, um capital que era monitorado através de um aplicativo que registrava os ganhos diários na operação. Posteriormente, ela   foi notificada que devido a problemas virtuais e operacionais os saques seriam suspensos por um período de 40 dias.

O empresário de sucesso e que vivia um elevado padrão de vida marcado pela ostentação, com carros de luxo e    viagens internacionais, acalmou os investidores em lives nas redes sociais, fazendo o que a policia considerou uma espécie de jogo de cena,  através de golpes estimulados pela ilusão e pela esperteza. Nas investigações também ficou constatada a inexistência na bolsa de Londres de qualquer cadastro da Chutehold, a sua empresa, que tinha sua base teórica na Inglaterra.

O delegado da PF, identificado como Fernando Pires Branco, considero que a Chutehold foi estruturalmente o projeto de uma pirâmidade que começou a ruir e que era mantido por informações de  clientes nas redes sociais, um dos quais contando que em três meses de operação ganhou R$ 400 mil. O delegado também considera que o sistema era mantido artificialmente através de muita ostentação e  de uma vasta rede de contatos conseguidos pelo fraudador cujo aplicativo sumiu juntamente com a plataforma após a divulgação do golpe.

Em tempo: o golpista teve o nome incluído na lista vermelha da Interpol, que o tornou procurado em todo o mundo, mas acabou localizado em Dubai levando uma vida de milionário. Alias Dubai é também, por coincidência, o mesmo destino de um itabunense que aplicou um golpe financeiro também de R$ 200 milhões pelo poderoso sistema de pirâmidade em clientes incautos da  Bahia, Amapá, Pernambuco, Paraíba, Sergipe, Minas Gerais e São Paulo, que deveriam saber, pelo menos teoricamente, que dinheiro não dá em árvores e nem rende por um simples lance de mágica, mas quando um trouxa nasce, dizem, o sabido bate palmas.(Kleber Torres)