Candidato
da Espanha ao Oscar 2015 na categoria melhor filme estrangeiro, Viver é
Fácil Com os Olhos Fechados tem como referência de título o primeiro verso
da segunda parte da música Strawberry Fields Forever, destacando que Living is easy with eyes
closed. O filme é um Road Movie misturando com excelentes resultados
realidade e ficção a partir de um fato real: a ida de John Lennon à Espanha para
filmar Como Eu Ganhei a Guerra, rodado em 1966, durante a ditadura
franquista, o que gerou uma ampla polêmica internacional.
O
filme começa com um curto documentário mostrando o sucesso global dos Beatles e
fatos polêmicos sobre o grupo já em fase de desagregação como a comparação de
Lennon no auge da banda declarando: “Atualmente
somos mais populares que Jesus Cristo".” O roqueiro
iconoclasta também se queixa no documentário das pressões cotidianas que
colocavam em questão a própria individualidade dos artistas, que já não sabiam
quem eram em função das apresentações contínuas em vários países e das exigências
do marketing dos seus promotores e produtores.
Tudo
começa quando, em plena ditadura do generalíssimo Franco, Lennon, com a mulher,
filho e equipe de filmagem se desloca para a cidade espanhola de Almería, com o
objetivo de rodar um longa-metragem. A filmagem ocorre em meio aos rumores de
dissolução do grupo o que aconteceu somente três anos depois.
O
filme tem como personagem principal o solitário professor Antonio San Roman (Javier
Cámara), que leva uma vida modesta ensinando
inglês e latim numa rígida escola religiosa. Ele procura ensinar a língua
inglesa aos alunos usando canções dos Beatles e numa das aulas ele faz uma análise
da letra de Help (Ajude), que tem um sentido amplo com metáforas sobre a juventude e a idade adulta, até porque
todos nós em um momento da vida vamos necessitar
de algum tipo de ajuda de alguém.
Tudo
muda quando Antonio descobre que seu ídolo Lennon está em Almeria, uma pequena
cidade onde prosperam melecas e ramelas. Então, ele pega o seu velho carro e parte de Madri para o
interior, disposto a conversar com John Lennon e reclamar porque os discos dos
Beatles não traziam no encarte as letras das músicas. Coincidência ou não entre
realidade e ficção, o filme faz referência no final, que após 1966, os discos
da banda britânica na Espanha tiveram encartes com as respectivas letras das
músicas.
Nesta
viagem ele encontra dois jovens a quem oferece carona: a bela Belén (Natalia
Molina) uma adolescente que esta enjoando no terceiro mês de gravidez e Juanjo
(Francesc Colomer),iniciando uma viagem quixotesca marcada de esperança e muitas
decepções. Os três oferecem o lastro da dimensão humana do filme com seus
dramas: um professor solitário e que era um beatlemaníaco, uma jovem sem rumo e
que se prepara para ter um filho, mas que rejeita uma proposta de casamento do
professor e acaba tendo momentos íntimos com Juanjo.
Juanjo,
que criava cabelos longos como os dos Beatles, era um jovem rebelde, que foge
de casa aos 16 anos por contestar a autoridade paterna e esta mais sintonizado com
os Rolling Stones, considerados mais agressivos e mal comportados.
O
jovem acaba agredido por fregueses machistas do bar onde vai trabalhar e o
professor Antonio acumula além disto frustrações pelo fechamento da estrada que
dava acesso ao local das filmagens, o que o faz indagar porque tudo dava errado
com ele. Outra tentativa frustrada dele é quando chega à casa alugada por Lennon
e expulso do portão pela mulher do músico e ator, Cynthia que joga em sua
direção caqueiros de planta quando o professor tentava abordar o filhote do
casal, Julian Lennon.
Cabe salientar que o professor tem sucesso no encontro com o Beatle depois de
um contato com um integrante da equipe de filmagem no cinema onde eram rodadas
as cenas de cada dia de filmagem, mas o encontro é particular, no set de
filmagens sem testemunhas, porque o astro do rock era uma pessoa tímida. O
professor é recebido pelo roqueiro numa motorhome.
O
filme tem no seu titulo uma critica velada à
sombria ditadura franquista que deixou no seu rastro milhares de mortos.
O diretor David Trueba consegue colocar na
tela os dramas e sonhos humanos, bem como a questão da deficiência de Bruno, um
jovem com lesões no cérebro e que vive restrito a uma cadeira de roda.
Além
de conseguir mostrar a dimensão dos dramas humanos e tapas em profusão em várias
sequencias, o filme também prima pela qualidade da fotografia no quente verão
espanhol e ao resgatar o figurino de uma época de mudanças culturais aceleradas.
Em
Viver é Fácil com os Olhos Fechados o
professor Antonio mostra que não se pode viver com medo e é preciso ousar, não apenas
contra uma ditadura fascista, mas e também contra os seus simbolos um padre
ranzinza que aplicava tabefes nos alunos.
O
professor também nos alerta para que não se deixe roubar a dignidade e enquanto
Juanjo volta em companhia do pai e de Belén para Madrid. Ele, antes do retorno
à capital espanhola destrói a plantação de morangos (strawberry fields) do agricultor
que espancou o jovem e o havia agredido quando foi exigir que o mesmo se desculpasse
junto ao adolescente.
Realizado
nesta missão, o professor vibrava bem alto “Help” ao volante do seu pequeno
carro e como um quinto beatle sumiu na estrada retornado para casa ao som de
Strawbarry Fields Forever, talvez mostrando uma contradição de que viver não é fácil
muito menos de olhos fechados e como dizia o nosso Guimarães Rosa, é muito
perigoso. (Kleber Torres)
Ficha técnica:
Titulo : Viver é fácil de olhos fechados
/ Living is easy with eyes closed
Direção e roteiro : David Trueba
Elenco : Francisco Colomer (Juanjo), Javier
Câmara (Antonio), Ramon Fontserè (Ramon), Natalia Molina (Belén), Rogelio Fernandez
(Bruno), Jorge Sanz (Dad) e Violeta
Rodriguez (Julia)
Música : Pat Matheny e Charlie Haden
Cinematografista : Daniel Pilar
Espanha
Colorido
105 minutos