domingo, 6 de março de 2022

O mago que uniu o tango ao jazz e a música clássica



 

 

Um retrato da vida tumultuada do lendário do compositor e bandeonista Astor Piazzolla, filho de Italianos e  que se vivo o fosse, hoje teria mais de 100 anos, é o resultado do filme Piazzolla: os anos do tubarão, dirigido por Daniel Rosenfeld, que também participou da elaboração do roteiro ao lado de  Fernando Regueira.  O documentário foi construído a partir de imagens e registros de áudio inéditos, descobertos pelo filho Daniel Piazzolla, o que permite uma visão da música e da sua arte revolucionária mudando em definitivo os rumos da história do tango ao incorporar referências do jazz e da música clássica, além de mostrar a intimidade do músico com a família, amigos e os seus projetos  pessoais.

 

Piazzolla aprendeu bandeon no Bronx, onde sua família passou a residir num bairro judeu depois de se mudar da Argentina para os Estados Unidos. Ali ele também começou a lutar box e aprendeu uma regra básica e que aplicou de certa forma na vida prática: “nunca espere ninguém bater primeiro”. Como musico, ele fez três apresentações num hospício, onde o conheceu  o poeta Jacobo Fijman, que  passou 24 anos internado e não queria sair porque não tinha ninguém lá fora, para quem tocou Balada para um louco fazendo com que os pacientes rissem e chorassem nas execuções do tango.

 

Ainda em formação, Piazzolla também estudou música clássica para aprender teoria e composição. Como exercício, fez adaptações da música de Bach para o bandeon com sucesso. Ele também conheceu Carlos Gardel, que na época precisava de um garoto entregador de jornal na filmagem do El dia em que me quieras, em 1935. Gardel ficou impressionado com o jovem e o convidou para  tocar em sua casa, elogiando o seu desempenho. Ele também o convidou para a mesma turnê em que Gardel acabou morrendo num acidente aéreo.

 

Em 1936, Piazzolla começa a tocar numa orquestra de tango integrada por 13 músicos e começou a aprender piano com o compositor erudito argentino Alberto Ginastera. Esta experiência lhe permitiu incorporar os conhecimentos da música clássica e do jazz para o tango, fazendo uma música para as pessoas que pensam.

 

Ele se casa e monta a sua primeira orquestra própria em 1946, mas não atraia o público para as casas noturnas em que se apresentava. Então, ele decidiu não mais tocar num cabaré e compôs a Sinfonia de Buenos Aires – uma rapsódia portenha, que lhe valeu um prêmio internacional para estudar composição e orquestração com Nadine Boulanger, em Pris, levando seu bandeon e lá desenvolve um conceito do tango novo. Boulanger também orientou celebridades da música como Burt Bacarath, Egberto Gismonti, Igor Stravinsky e Quincey Jones.

 

Após o curso na Europa, ele volta para a Argentina onde foi lutar como um gladiador em busca do reconhecimento estético da sua música. Ele também assistiu ao mesmo tempo em Buenos Aires, a queda do ditador Juan Domingo Peron e a crise do tango, que perdia espaço para o rock, que conquistava os jovens portenhos.

 

Em 1955, desenvolve a proposta do tango para ouvir, com uma banda com oito instrumentistas, num período em que a música era o que mais lhe interessava na vida. Piazzolla também sentia que os jovens não mais queriam dançar o tango, que era complicado e desenvolveu uma teoria do tango progressivo, com o octeto de Buenos Aires associando-o ao jazz e ao clássico.

 

Sem apoio, ele decide deixar Buenos Aires na busca de novos rumos e em dificuldades financeiras aceitou um emprego de tradutor no Banco da Argentina, em Nova York, onde passou a viver. Neste período, compôs em 30 minutos Adeus Nonino, dedicado ao seu pai morto, o que considerou um momento especial na sua vida e passou a comandar um quinteto e a banda Nova Guarda, dando continuidade ao projeto para uma mudança harmônica e rítmica mais emocionante, mas sem perder a essência do tango, com uma música nova e que atraia a atenção dos amantes do jazz.

 

Nesse interim, ele se separa da mulher e começa a fazer sucesso com o quinteto, abocanhando na época um prêmio de US$ 2,5 mil em um concurso num festival de música  e dança com a Balada do Louco. Em seguida,  inicia uma parceria  exitosa com o saxofonista Jerry Mulligam, no período quando passou a ser conhecido internacionalmente e aplaudido pelo publico.

 

Em 1978, Piazzolla retorna para a Argentina e volta a tocar com o quinteto. A sua filha, que fazia oposição ao governo militar na Argentina, não perdoou o seu almoço com o general Vidella. Mas o músico continuou a sua trajetória de sucesso considerando que a sua música continuava em evolução e atual, “tem um pouco de tango, mas é o mundo de Piazzola, uma música romântica  e com muita ternura. Estou no período do tubarão: pesco um dia e no outro componho.”

 

Em 1988 , ele se apresenta no Teatro Cólon e depois foi operado do coração, sendo aconselhado a deixar os palcos se dedicando apenas a compor, mas obstinado,[ não obedeceu às ordens médicas e continuou se apresentando. No filme, ele confessa que foi o filho que Nonino  queria ter: “ele lutou muito por mim,” mas acaba doente e paralitico, e passa paralítico o último ano de sua vida sem pescar tubarões e sem compor, conhecendo a profundidade e os limites absolutos da solidão e da morte.(Kleber Torres)

 

Ficha técnica :

Título Piazolla: los años del tiburón (Piazolla : os anos do tubarão)

Direção: Daniel Rosenfeld

Roteiro : Daniel Rosenfeld/Fernando Regueira

Elenco : Astor Piazolla, Daniel Piazolla, Alejandro Varillo Penovi

Produção : Frabnçoise Grazi

Gênero : documentário

Duração : 90 minutos

Ano : 2018

País : Argentina / França

 

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