sábado, 2 de outubro de 2021

O fake por trás do mundo robotizado dos influenciadores digitais


  

Considerado como um experimento social inovador com a participação de influenciadores digitais, o filme Fake Famous: influência e fama na era digital, dirigido por Nick Bilton e exibido pela HBO, tem como referenciais o fato de que em todo o mundo 40 milhões de pessoas têm mais de um milhão de seguidores nas redes sociais e que outros 100 milhões têm em média mais de 100 mil seguidores, sendo considerados celebridades no complexo e disputado universo digital. O experimento envolve três jovens de Los Angeles, com o número de seguidores relativamente pequeno, que são turbinados com a  compra de seguidores falsos e apoio de um exército invisível de robots, conhecidos como bots.

A filme exibido este ano tem como pressuposto que a fama é uma coisa obscura e estranha, pois no passado as pessoas eram famosas em função da suas habilidades  artísticas ou esportivas,  hoje, pela sua capacidade de influenciar as pessoas através da redes sociais, tendência se acentuou a partir da pandemia provocada pela covid-19.  Ele também reúne depoimentos de Taylor Lorenz, que é  repórter de tecnologia do The New York Times); da influenciadora Liz Eswein; da jornalista Sarah Frier, do Bloomberg e da escritora Justine Bateman, autora do livro Fame: The Hijacking of Reality) e diversos especialistas em comunicação digital.

Fake Famous tem como contraponto o novo coronavirus, pandemia que  forçou as pessoas ao isolamento e distanciamento ampliando o seu acesso às redes sociais, as quais extrapolaram a sua dimensão de meros aplicativos para postagem de fotos e mídias diversas, fomentando uma indústria que movimenta milhões de dólares em escala global através de negócios e campanhas de vendas.

Além de discutir o que é e qual a função de um influenciador digital, Fake Famous,  o filme mostra o desempenho de três personagens: Dominique Druckman, uma atriz de filmes sobre adolescentes rebeldes e que vivia na expectativa de sua grande chance  no cinema; Chris Bayley estilista e cantor que sonhava se impor no mundo da moda com peças únicas e aplicava sua arte em roupas de segunda mão.

O terceiro elemento no experimento foi Wylie Heiner, assistente  imobiliário, destacando no filme que a experiência como influenciador digital foi exaustiva  e competitiva o que acabou resultando na sua desistência do processo em que afinal todo o mundo conhece alguém famoso no Instagram. Em termo de expectativas, ele espera atuar em um outro filme e na vida real, prosseguir seus estudos para  trabalhar em projetos educacionais com outros grupos marginalizados.

Partindo do pressuposto de que os influenciadores digitais ganham seguidores por meio de curtidas, compartilhamentos e patrocínios, um processo que pode ser inflado com o suporte de um verdadeiro exército de bots – robôs - contratado  para gerar engajamento e motivar a participação de pessoas, elevando artificialmente os perfis e o status do influenciador digital. Hoje, a estimativa é de que 48% das atividades nas redes sejam realizadas através de pessoas e o restante por robôs, que aceleram as curtidas, gerando tráfego e retorno financeiro aos envolvidos neste negócio.

 

O projeto começou com uma produção e investimentos nos três personagens do experimento que ganharam novo corte de cabelo, um novo look no seu visual, além, naturalmente da compra de seguidores falsos, os mesmos que são usados através de robôs  para a criação de pessoas falsas e noticias idem. Depois destes preparativos, os três influenciadores passaram por uma bem cuidada sessão de fotos, como a de uma outra profissional desta área, que comodamente fez uma “viagem” a Bali, passando com sua equipe de produção apenas por uma sofisticada loja de departamentos.

 

O dado observado na pesquisa é que a compra de seguidores tem de ser feita de forma discreta com a aquisição gradual  de 7,5 mil adesões num dia para não alertar aos algoritmos das operadoras das redes sociais. As adesões, falsas ou verdadeiras  servem de padrão para a obtenção do patrocínio de produtos ou empresas que operam no mercado real.

 

A ideia da pesquisa foi forjar viagens, caminhadas, hospedagem em hotéis e mansões – alugadas por uma diária inferior a mil dólares – ou mesmo viagens de primeira classe em jatinhos fakes, cujas cabines são alugadas por menos de 100 dólares por hora, com excelentes resultados. Quem pretende um custo menor nestas viagens em jato executivo pode usar criativamente até uma tampa de vaso sanitário para imitar a janela de um avião, com custo de apenas  uma dezena de dólares.

 

Uma estatística apresentada no filme é que mais de 60% dos likes de pessoas famosas, consideradas celebridades nas redes sociais são movimentadas por bots falsos. Já a  socialite Kim Kardashian, uma celebridade no mundo  dos influenciadores digitais,  cobra, por exemplo,  500 mil dólares por uma postagem no Instagram e em média, um profissional posta em média três a quatro informações por dia.

O diretor Nick Bilton, um jornalista experimentado,  atinge o objetivo proposto pelo projeto do filme ao  questionar a fama e a influência na era digital, num  mundo em que as pessoas estão em busca do sucesso e do reconhecimento nas redes sociais. O processo envolve bilhões de seres humanos em escola planetária, num universo onde 140 milhões de pessoas, o equivalente a metade da população dos Estados Unidos têm mais 100 mil seguidores.

A aspirante a atriz Dominique Druckman começou a receber produtos e passou a ser  procurada por empresas quando superou a marca dos 100 mil seguidores. Também foi convidada para uma viagem com influenciadores para Las Vegas promovida por uma indústria de roupas, com direito a uma parada para fotos no deserto e até um parque aquático abandonado.

Ela conta no filme que a experiência de uma semana em tempo integral de dedicação à atividade de influenciadora digital serviu para definir  uma nova meta para chegar a 250 mil seguidores. Mas mesmo com a pandemia, ela continuou a receber presentes e produtos, inclusive de uma joalheria.

Wylie Heiner  teve uma experiência interessantes, com 165 curtidas e muitos comentários num curto espaço de tempo após uma postagem turbinada por bots. O fato é que cada um dos envolvidos na pesquisa  passa a ter experiências totalmente diferentes à medida que seus falsos seguidores construídos por hackers, com base em pessoas existentes na base de dados da rede mundial de computadores , crescem aos milhares a cada dia, quando a própria realidade se confronta com os sonhos.

O estilista Chris  Bayley, desiste do projeto por considerar que pretendia ser famoso por ser autêntico, mas sem a ajuda de bots e não como Dominique Druckman, que virou uma outra pessoa e ganhou até férias grátis e patrocinada, mas com a pandemia passou a perceber que tudo é falso, com influenciadores se exibindo em praias de biquíni num período de distanciamento social, enquanto cantores de ópera e artistas cantavam em varandas levando alegria para as pessoas em isolamento e afetadas por uma pandemia que custou a vida de mais de cinco milhões de pessoas em todo o mundo.

“No meu caso,eu não preciso ser repaginado”, destacou Chris  Bayley que optou por deixar o projeto junto com Wilei Heiner. Também foi constatado que apesar da pandemia os influenciadores digitais aumentaram o número de seguidores reais, uma provável consequência dos isolamento das pessoas.

Fake Famous revela por fim como o mundo online perpetua uma falsa sensação de glamour, mas que está cada vez mais distante da realidade das pessoas e mesmo de toda uma geração que sofre de depressão, ansiedade e vício nas mídias sociais, num contraponto a um período de crise agravado pela pandemia da covid-19, o que nos leva a refletir sobre a realidade e sobre a possibilidade de construção de um mundo inteiramente fake, onde tudo é falso,  como uma simples peça de ficção e de pronta reposição. (Kleber Torres)

 

Ficha técnica

 

Título: Fake Famous: influência e fama na era digital

 

Direção : Nick Bilton

 

Direção de fotografia : Barney Broomfield

 

Música : Michael Abels


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