domingo, 4 de agosto de 2024
A arte acima das tragédias pessoais, da guerra e da própria fé
Um dos precursores do existencialismo, Ortega y Gasset considerava que o homem é ele e as suas circunstâncias. O filme Quando os sinos tocam (2024), de Joshua Enck, retrata poeticamente o drama do consagrado vate americano Henry Wadsworth Longfellow(1807-1882) interpretado pelo ator Stephen Atherholt, autor de The Song of Hiawatha, A psalm of life, Paul Revere’s Ride, Voices of the night e Hyperion, uma novela romãntica de suas viagens à Europa, onde perdeu a primeira mulher após um aborto, que para de escrever durante a Guerra de Secessão (1861-1865), depois de atingido por uma tragédia familiar, o que colocou em xeque a sua fé e mata a sua inspiração.
Embora pouco conhecido no Brasil, Henry Wadsworth Longfellow foi um influente poeta e educador americano do século XIX, que marcou posição no combate à escravidão. Ele também se tornou uma celebridade influente nos meios políticos e ficou conhecido como profeta da nação, por suas obras líricas e narrativas, além de ter traduzido A Divina Comédia, um clássico de Dante Alighieri. Longfellow era um autor tão popular que num só dia, vendeu num lançamento em Londres, mais de 10 mil exemplares de um dos seus livros, que se tornou um best seller fora dos Estados Unidos.
O seu drama pessoal começa com a morte da sua mulher Fanny Longfellow (Rachel Dau Hughes), que o chamava de “meu poeta” e a quem Henry considerava “minha poesia”, uma das suas críticas e a quem considerava como uma espécie de musa inspiradora, morta num incêndio que ele não consegue controlar. A sua depressão se agrava em função da Guerra de Secessão (1861-1865), que custou mais de um milhão de vidas de americanos envolvidos numa guerra fraticida entre o sul e o norte dos Estados Unidos, após a libertação dos escravos.
O conflito atinge a família do poeta, cujo filho Charley Longfellow (Jonathan Blair) se alista e acaba gravemente ferido, mesmo sendo protegido por oficiais superiores que lhe davam tarefas fora das linhas de combate. Deprimido o poeta questiona a sua fé em Deus e na arte ao declarar: “se Deus me deu uma voz de poeta, porquê ele tirou a poesia de mim?” Para ele o problema é que quando o tempo tem cheiro de pólvora, a literatura e por extensão a arte perdem o sentido, o que também ocorre nos dias atuais.
O recomeço fica por conta da volta do filho pródigo, que se recupera em casa dos graves ferimentos numa emboscada e que lhe descreve poeticamente o que viu quando ferido e abrigado numa igreja metralhada pelo exército sulista. A torre da igreja caira depois de um bombardeio e o sino, mesmo no chão, ainda tocava. A retomar a sua arte, o poeta também reconstruiu com os filhos os laços familiares e a sua fé expressa no trecho de um dos seus poemas: “o amanhecer está próximo, a noite é estrelada. O amor é eterno!Deus permanece Deus, e sua fé não faltará; Cristo é eterno”! O filme busca a ligação possível entre o cinema e a poesia, que pode estar em toda parte, inclusive no deserto e até descansando no vazio das idéias ou esperando sempre no espaço em branco de uma folha qualquer de papel ou de uma tela.(Kleber Torres)
Ficha técnica:
Título : I heard the bells (Quando os sinos tocam)
Direção : Joshua Enck
Roteiro : Joshua Enck e Jeff Bender
Elenco: Stephen Atherholt, Rachel Day Hughes, Jonathan Blair, Ava Munn e Zach Heeker
Direção de Fotografia : Steve Buckwalter
Música : Chad Marriot
Estados Unidos
115 minutos
2024
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