quarta-feira, 24 de julho de 2024
A última sessão de uma tragédia anunciada
A ascensão meteórica e a queda dramática de uma startup, o que acabou virando caso de polícia e na investigação de fraudes contábeis e operacionais, é o tema do documentário MoviePass, Movie Crash, dirigido por Muta’Ali Muhammad e exibido no Brasil através de streaming pela HBO, com o título MoviePass: a última sessão, sobre um serviço de assinatura para ingressos de cinema através do pagamento de um valor mensal de assinatura. O filme foi lançado este ano, reúne depoimentos de executivos da empresa, técnicos, pequenos investidores que acabaram lesados pela falência do negócio e usuários do serviço, alguns dos quais ainda guardam o cartão da MoviePass de acesso aos cinemas.
O filme mostra a empresa que mais cresceu na história da mídia com preços de ações em ascensão explosiva e captando milhões de usuários. Fundada e dirigida por dois empresários negros Stacy Pikes e Hammed Watt, a MoviePass acabou parando mas mãos de Mitch Lowe e Ted Fransworth, um empreendedor de projetos multiplos, que controlava o fundo HMNY, que afastaram os idealizadores do projeto e sucatearam a empresa canibalizando-a através da promoão eventos multmídia, anunciando investimentos na produção de filmes e gastos superfluos que sangraram a empresa em US$ 1 milhão de dólares por dia. Resultado a empresa perdeu mais de US$ 230 milhões num curto espaço de tempo, o equivalente a mais de R$ 1 bilhão e se transformou numa massa falida, que acabou sendo readquirida por Stacy Pikes num leilão judicial e agora investe na sua recuperação com a mesma marca.
Tudo começou em 2011 com uma pequena empresa que começou a crescer e não atraia investimentos, porque os seus gestores eram negros. No mercado americano as mulheres e as minorias só têm acesso a 3% dos investmentos de risco. No filme Mich Lowe, que entra na empresa em 2016, se apresenta como os dos participantes da criação da Netflix. Em realidade, ele apenas fornecia discos e filmes na fase inicial da empresa, mas procurava mostrar sua relação com o cinema, lembrando que na infância era levado de carro pela tia para assistir filmes como Psicose, de Alfred Hitchcock, escondido debaixo de uma coberta para não pagar ingressos.
A história do MoviePass mostra como o crescimento rápido – comparado metaforicamente como da construção de um avião em pleno voo - e não sustentável pode levar a falhas catastróficas resultando em prejuízos para a empresa, parceiros de negócios, trabalhadores e usuários do serviço idealizado para operar com um custo médio mensal de US$ 39,95 por usuário que poderia assistir quantos filmes quisesse. A taxa mensal chegou a ter um custo de US$ 10 por mês, o que permitiu a expansão vertiginosa do número de assinantes, 100 mil dos quais conseguidos 48 horas após o início da campanha, isso quando a empresa tinha apenas 50 mil cartões em estoque, o que forçou medidas emergenciais para a compra do material necessário inclusive com a ajuda de carros fortes para o seu transporte.
O documentário também revela como a ganância e as decisões mal orientadas dos executivos Mitch Lowe e Ted Fransworth podem destruir uma empresa promissora e com potencial de expansão. A história também enfatiza a necessidade de uma gestão ética e transparente não só no campo governamental, como também no mundo corporativo. Uma auditoria em 2018 revelou que a MoviePass registrava uma perda de US$ 150 milhões, derrubando os preços das suas ações que tinham subido de US$ 2 para US$ 38.
A história da MP oferece lições são valiosas para empreendedores e investidores, bem como para qualquer pessoa interessada em startups, negócios e a indústria do entretenimento.A ideia do MoviePass era inovadora, mas a empresa para operar tinha de estabeecer acordos com as distribuidoras e produtoras como a AMC, que num primeiro momento se negou a participar da parceria com a MP e depois acabou aceitando um acordo, que foi rompido posteriormente. O projeto, considerado bem sucedido, parecia que poderia mudar a indústria do entretenimento e gerou um aumento em 112% no registro de ida da população aos cinemas nos EUA.
MoviePass, Movie Crash mostrou como a startup tentou negociar com as grandes redes de cinema e como essas negociações muitas vezes foram complicadas e tensas, o que mostra os desafios de tentar inovar em uma indústria estabelecida e na área de entretenimento. O fato é que o modelo de negócios do MoviePass, oferecendo ingressos ilimitados por uma taxa mensal muito baixa, realmente parecia insustentável, porque a conta não fechava e os custos operacionais excediam as receitas, uma vez que a empresa estava comercializando ingressos a um preço muito inferior ao custo real, o que inevitavelmente levou a déficits crescentes agravados pelas grandes perdas financeiras com eventos de marketing e gastos supérfluos.
Mitch Lowe afastou os dois criadores do negócio, mas não fez aportes significativos de capital para o projeto. Em 2017, Ted Farnsworth trouxe através do fundo HMNY recursos para a empresa, o que atraiu os investidores, provocando uma elevação de 146% nas suas ações e atingindo um milhão de usuários ativos, um dos quais foi ao cinema 428 vezes, mediante o pagamento mensal de uma tarifa básica de US$ 10 por mês. Para o usuário, o problema do custo era do sistema, e não dele.
Nas manobras de sucateamento da MoviePass, os novos gestores impediram que os fundadores da empresa pudsessem vender as suas ações com valor estimado de US$ 80 milhões. Com a perda da qualidade do serviço, bloqueio de cartões e falta de investimentos em infraestrutura – a MP investiu mais de um milhão de dólares num evento de mídia – quando estava com problemas na expansão das sua rede de computadores para melhor atender aos usuários, com um custo muito menor.
Com a crise instaurada e sem recursos, Lowe, que foi viver no México, transferiu o comando da empresa para Kalid Ithum que entrou no negócio pela janela, assumindo inicialmente a vice-presidência de eventos e um escritório especial da MP em Los Angeles. Nesse interim, Ted Fransworth, que tinha negócios até com a vidente La Toya Jackson, descansava e curtia viagens de lazer com amigos num moderno iate pelo Caribe. Já a MoviePass e o HMNY tiveram falências decretadas.
Em 2020, a FTC (Comissão Federal de Comércio) e o FBI iniciaram uma investigação sobre as duas empresas falidas por fraude no bloqueio de clientes – sua principal fonte de renda – e pelos prejuizos aos pequenos investidores. Mick Lowe e Ted Fransworth fizeram um cordo com a FTC e o seu processo continua a tramitar na justia americana. Como a corda arrebenta do lado mais fraco, Kalid Ithum foi condenado em dois processos por fraude e desvio de US$ 260 mil do MP e do HMNY num evento em 2018 em Coachela. Já Stacy Pikes que readquiriu a MoviePass, que registrou seu primeiro lucro na história em 2023.
Em síntese, a lição que fica do documentário é que os gestores brancos e de cabelos grisalhos com trânsito no circuito financeiro, que arruinaram a empresa, a conduziram como a montagm de uma peça de teatro que precisa de uma estrela, uma história e um acessório, no caso a Movie Pass ou de modo cinematografico, como na cena em que Thelma (Geena Davis) e Louise (Susan Sarandon), no filme de Ridley Scott, rodado em 1991, pisaram fundo no acelerador jogando o carro, nesse caso a MoviePass, no abismo. (Kleber Torres)
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