quinta-feira, 26 de junho de 2025
Uma viagem muito além das estradas do mundo e da vida
A maior ousadia do filme na Estrada baseado no romance On the Road, de Jack Kerouac, é justamente tentar adaptar um dos romances mais emblemáticos da literatura beat e considerado uma obra infilmável pela própria estrutura complexa da obra. O livro que serviu de base para o roteiro de José Rivera foi escrito num estilo de fluxo de consciência e com estrutura fragmentada a partir das ideias dos personagens, o que dificulta a sua transposição para o universo cinematográfico, mesmo assim o diretor Walter Moreira Salles, optou por uma abordagem sensível e respeitosa, buscando preservar o espírito errante, contestatório e existencial da obra original, que foi um marco da geração beat e considerada um ícone da contracultura ao retratar a viagem no sentido mais amplo de dois amigos através dos Estados Unidos em busca da liberdade e de novas experiências existenciais.
Em termos de estética, linguagem cinematográfica e visualmente o filme é deslumbrante. A fotografia de Eric Gautier capta com lirismo as paisagens norte-americanas, reforçando o sentimento de deslocamento e busca dos personagens. A trilha sonora de Gustavo Santaolalla, com forte influência do jazz e do blues, ajuda a traduzir o ritmo literário e temporal de Kerouac para o cinema.
Apesar da beleza visual e da sua plasticidade, o filme enfrenta dificuldades em capturar a profundidade emocional e o fluxo interno do que passa na cabeça dos personagen deixando a narrativa, por vezes, episódica e aparentemente desconectada, o que pode dificultar o envolvimento do espectador com os personagens. Ele descreve bem a geração beat retratada Sam Riley (Sal Paradise), um jovem escritor que tenta decolar no mundo literário e ao mesmo tempo atua de forma mais contida, refletindo o papel de observador do protagonista, que é em realidade um alter ego de Jack Kerouac.
Já Garrett Hedlund (Dean Moriarty) , que na vida real seria Neal Cassidy, considerado uma das figuras centrais da Beat Generation dos anos 1950 , influenciando a contracultura e o movimento psicodélico, tem papel de destaque no filme. Na vida real ele também escreveu O primeiro terço e influenciou obras como Uivo, de Allan Ginsberg, que aparece no filme interpretado por Tom Sturridge, enquanto Kristen Stewart surpreende como Marylou, trazendo sensualidade num triângulo amoroso e vulnerabilidade ao papel.
Em essência, o filme aborda temas como liberdade, rebeldia, insatisfação, sexualidade e o vazio existencial da juventude do pós-guerra, sem perspectivas para o amanhã. No entanto, ao condensar o livro, o roteiro deixa de lado muitos momentos de introspecção e crítica social. Na Estrada é uma obra visualmente rica e emocionalmente sincera, mas que não consegue traduzir por completo a intensidade e o caos criativo do livro de Kerouac, marcado pela rebeldia. Ainda assim, é um filme que merece ser visto — não como substituto da obra literária, mas como uma homenagem cinematográfica à inquietação de uma geração que influenciou a contracultura e ao movimento hippie dos anos 60.
Enquanto o livro é profundamente introspectivo e baseado em fluxos de consciência. O filme enfrenta o desafio de converter esse processo em imagens na linguagem cinematográfica. A estética polida do filme contrasta com a crueza da literatura de Kerouac. Os bastidores de Na Estrada foram uma verdadeira jornada — quase tão intensa quanto a dos personagens do filme. Walter Salles mergulhou profundamente no universo da geração beat para adaptar o romance de Jack Kerouac com autenticidade e sensibilidade.
Antes mesmo das filmagens, Salles refez duas vezes o trajeto original percorrido pelos protagonistas do livro, cruzando os Estados Unidos de costa a costa pela rota 66. Durante essas viagens, ele também gravou um documentário com entrevistas de figuras ligadas à cultura beat, como a poeta Diane di Prima e o escritor Eduardo Bueno. A ideia era captar o espírito da época e entender o que movia aqueles jovens em busca de liberdade e transcendência.
Francis Ford Coppola, que detinha os direitos do livro há três décadas, escolheu Salles para dirigir o longa-metragem após assistir Diários de Motocicleta, outro road movie dirigido pelo cineasta brasileiro, que ganhou o Oscar melhor filme internacional em 2025, com Ainda estou aqui . A escolha não foi por acaso: ambos os filmes (Diários e Na Estrada) compartilham o desejo de capturar o movimento, a inquietação e o desejo de transformação.
Coppola tentou desenvolver o filme com diferentes roteiristas e diretores, mas esbarrava sempre na estrutura não convencional do romance, cheio de idas e vindas, e na dificuldade de capturar o espírito da geração beat. Em um depoimento a jornalistas, ele chegou a dizer que adaptar o livro foi uma verdadeira dor de cabeça e que chegou pensar em desistir da ideia.(Kleber Torres, com informações complementares do Copilot)
Ficha técnica:
Título original: On the Road
Direção: Walter Salles
Roteiro: Jose Rivera
Elenco principal: Sam Riley (Sal Paradise), Garrett Hedlund (Dean Moriarty), Kristen Stewart (Marylou), Tom Sturridge (Allan Ginsberg), Bill Lee (William S. Burroughs), Kirsten Dunst, Viggo Mortensen, Amy Adams e Alice Braga
Ano de lançamento: 2012
Duração: 139 minutos
Gênero: Drama, Aventura
Classificação indicativa: 16 anos
Países de origem: Alemanha, Argentina, Brasil, Canadá, EUA, França, México, Países Baixos, Reino Unido
Produção: Francis Ford Coppola (executiva), Charles Gillibert, Nathanaël Karmitz, Rebecca Yeldham
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