Pedro
Malasartes um hiato entre o jeitinho
brasileiro e a corrupção
O filme
“As aventuras de Pedro Malasartes” (1960) produzido e dirigido por
Amácio Mazzaropi, resgata tradições da cultura oral popular brasileira e ao
mesmo tempo revela aspectos culturais da nossa formação como o tradicional
jeitinho brasileiro, a embromação ou a esperteza, que substituem o esforço do
trabalho produtivo e torna a honestidade irrelevante ou coisa de otário. Este
caldo se reflete nos problemas que vivemos hoje de corrupção e inépcia
generalizadas, que afetam a todos os setores da vida nacional e numa profunda
crise moral em que faltam referencias e padrões, resultando no aumento da violência
que se generaliza, na falta de controle dos presídios abandonados pelo
governo e no registro ano passado de 58
mil homicídios, o que equivale a 158 mortes desnecessárias por dia ou a queda
de um avião de grande porte a cada 24 horas.
Tudo
começa quando o personagem Pedro Malazartes (Mazzaropi), ao chegar em sua casa
na fazenda, recebe a notícia de que seu pai havia falecido. Como um caipira humilde, analfabeto e ingênuo, ele acaba enganado e lesado espertamente pelos
seus irmãos. Assim, enquanto um toma posse de todo o gado e dinheiro do
falecido pai, o outro assume de forma
plenipotenciária o comando da fazenda numa partilha leonina e que deixa o
terceiro irmão desfavorecido, pobre e deserdado.
Assim,
sem nada a que reclamar, Pedro Malasartes deixa a fazenda levando os teréns
quem lhe couberam por herança: um ganso,
um tacho velho e umas poucas roupas. No caminho, acaba sendo acompanhado por
uma namorada, a quem abandona e que o caça pelo sertão, bem como por porção de
crianças abandonadas de quem se torna uma espécie de provedor.
Duro, sem
dinheiro e sem saber como conseguir descolar uma grana para as despesas com os
órfãos que passam a segui-lo, ele começa então a aplicar pequenos golpes para
conseguir dinheiro. Assim, vende por 300 cruzeiros um tacho que cozinharia
sozinho sem fogo – naturalmente funcionaria num fogão elétrico - a um
homenzarrão; em seguida vende o ganso por mil cruzeiros dizendo que ele é
mágico e capaz de se comunicar com as pessoas.
Ele
ainda consegue com sua esperteza roubar uma charrete convencendo a dona
do veículo a ficar segurando o seu
chapéu no chão onde, supostamente, estaria preso um pássaro raríssimo e
do qual só existiam três espécies masculinas no Brasil.
A lista
de trambiques aumenta, com a venda de porcos que não eram dele, uma forma de
estelionato ou até mesmo de tentar vender uma árvore também rara, que produzia
dinheiro em lugar das folhas e que estava só botando notas de dez, porque não
fora adubada de forma adequada.
Assim,
ele se vê metido numa série de confusões e acaba preso, fazendo uma confusão
dos diabos no tribunal durante o seu julgamento, quebrando o martelo do juiz;
questionando o promotor que o chama de individuo de alta periculosidade,
alegando que não pode ser julgado por uma coisa que não conhece e contestando o
próprio advogado de defesa. Ele termina absolvido, arruma um orfanato para os
meninos abandonados que o acompanham e mais ainda consegue no local um emprego
para ele e a namorada, com quem acaba se casando e que só sabia mesmo criar
galinha e parecia inepta para o trabalho formal.
As
pequenas trapaças de Pedro Malasartes são fichinha e coisas de sacristão de
igreja diante da nossa realidade, num país em que os professores em grande
parte não ensinam o suficiente; os médicos cuidam prioritariamente da saúde
financeira de suas famílias e não do conjunto da população que padece nas filas
do SUS e não encontra medicamentos nas farmácias das prefeituras ou dos
hospitais aos quais têm de recorrer.
No país
também temos os nossos engenheiros e arquitetos de pirâmides financeiras que se
espelham pelos rincões da nação, enquanto servidores públicos reclamam de
salários, mas prestam um serviço de qualidade inferior para os contribuintes.
O
Brasil também tem problemas de corrupção
que se espraia na máquina policial, no sistema penal e isso sem falar nos
juízes, promotores ou ministros com direito a férias normais e mais a um
recesso de fim de ano ou ainda com magistrados punidos apenas com aposentadoria
por envolvimento em delitos graves, além da rede de empresários e políticos
processados e denunciados em grandes escândalos de corrupção a exemplo do
Mensalão e Lava Jato, coisa para ninguém botar defeito e que torna as aventuras
de Pedro Malasartes uma simples comédia diante da tragédia brasileira, mas que faz rir adultos e crianças de um
outro tempo. (Kleber Torres)
Ficha
Técnica
Título:
Aventuras de Pedro Malasartes
Direção:
Amácio Mazzaropi
Roteiro:
Marcos César e Galileu Garcia
Elenco: Amácio Mazzaropi, Geny Prado, Genésio Arruda
e Dorinha Duval
Género:
Comédia
Idioma:
Português
Brasil
1960
95
minutos
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