domingo, 13 de agosto de 2017

Um super herói contracultural e intergalático genuinamente baiano




Considerado um dos marcos da contracultura no Brasil, o filme  Meteorango Kid – Herói Intergalático (1969), dirigido por André Luiz Oliveira é um cult movie, mas ainda é pouco conhecido e tem sido mostrado raras exibições para cinéfilos, a última delas no Festival de Cinema de Invenção realizado no primeiro semestre deste ano pelo Canal Brasil, resgatando algumas das mais relevantes obras cinematográficas dos anos 60. O filme, que tem como destaque a fotografia e o enredo, foi proibido para menores de 18 anos e para veiculação na TV, mas conquistou no ano da sua estreia  o Prêmio Especial do Júri, o Prêmio da Opinião Pública e a Margarida de Prata da CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil no Festival de Brasília.
A história, que começa com chegada de um alienígena nos coqueirais baianos e se transforma em Lula, rapaz de classe média alta,  que sonhar ser um super herói e o astro principal do filme "Tarzan e as Bananas de Ouro", uma sátira ao modelo de Edgar Rice Burroughs, que criou o rei das selvas, quando sua empregada o acorda. Antes de sair de casa ao som de "É Proibido Proibir", Lula recebe um bilhete contando que Duda, um amigo, morrera e ao invés de se emocionar, ele ri da tragédia.
Na faculdade, ele destoa de um grupo de alunos divididos entre direitistas e esquerdistas e assim, procura não  se envolver com as discussões tão em voga no movimento estudantil num tempo de repressão e medo. Ao mesmo tempo, enquanto seus colegas  participam de discussões acaloradas e às sem sentido como uma metáfora para driblar a censura, Lula opta por ler uma revista uma em quadrinhos e depois em tirar sarro dos colegas.
Na sequência seguinte, ele entre  numa produtora cinematográfica e imagina ser o personagem principal de "Tarzan e as Bananas de Ouro". Ali, o produtor, que o conhece desde a mais tenra infância, propõe a sua inserção no  papel  central do seu próximo filme, desde que o pai de Lula, que é capitalista, invista no custeio da produção. O produtor também fala das regras do jogo do mercado cinemagráfico que para dar lucro exige cenas de sexo, mulheres bonitas e violência.
Ao sair  da produtora, Lula encontra com seus amigos Caveira e Zé Veneno, os três vão à casa de Caveira fumar maconha e sob os efeitos da erva, ele  se propõe a oferecer o produto aos seus pais que se escandalizariam. Em sua "viagem", Lula pensa estar em seu quarto e imagina se transformar num super-herói batmaniano, que comete parricídio. Numa outra sequência, Lula, Caveira e Zé discutem e ele pega uma arma e dá um tiro Caveira, porque matar o não matar é diferenciado apenas pelo ato de efetuar o disparo, o que lhe confere uma visão nietzscheana da vida e dos fatos.
Ao voltar para a rua, o herói intergalático encontra uma amiga jornalista e a acompanha até a Ilha de Bananal, onde pescadores garantem ter visto discos-voadores. O filme faz uma critica à desnacionalização e americanização da cultura brasileira com a influencia dos brasilianistas que estudavam a nossa cultura e a sociedade. Num outro corte, ele imagina fazer parte de um filme de ação, desta vez enfrentando piratas armados de metralhadoras e fuzis, usando lanchas no interior da Bahia de Todos os Santos.
Depois, ele vai ao velório de Duda, que se suicidara em uma poça d'água rasa no meio da rua, e se lembra, sem mostrar nenhum arrependimento, que o havia humilhado por ser homossexual. O pai de Duda pede que ele acompanhe sua filha até a casa da avó para dar um telefonema. Ao chegar, Lula dá um susto na velha, que desmaia, e ainda seduz e fatura a irmã do suicida. Ao voltar ao velório, ele diz jogando as cinzas de um cigarro no morto: "papei sua irmã".
Ao retornar para  sua casa depois de um dia cheio de aventura e desventuras, ele é surpreendido pela família e amigos que prepararam uma festa surpresa de aniversário. O filme também mostra uma sequência no Teatro Castro Alves, onde para assistir a uma peça, ele se apresenta montado num burro e faz propaganda se sabão em pó e de produtos que se contrapõem aos valores à  cultura, porque quando “não se pode fazer nada a gente avacalha”, como diz o Lula numa das suas reflexões.
As sequencias das cenas se contrapõem também com a de um vampiro magro e subdesenvolvido, que segue mulheres indefesas nas ruas e acaba esbarrando num cara cabeludo que de costas se parecia com uma mulher. Ele se vinga de tudo comendo uma maça. No mais o filme termina com o alienígena descendo da sua cruz e subindo anum coqueiro para um retorno  dialético ao hiperespaço.
Entre legendas de procurado viva ou morto para o personagem central, fica na tela um questionamento válido para o período da contracultura e para os tumultuados dias atuais: “o que será de mim e da minha vida ? E o que importa?” Afinal o filme termina com outra frase simbólica do tempo do desbunde: “curti adoiado...” 
Há quem acredite que o filme traça o perfil  de uma geração oprimida pela ditadura e pela moral de uma sociedade hipócrita, num período de mudanças radicais do paz e amor livre, bem como com a subversão da cultura e dos valores éticos e morais, mas que não resultou na construção de uma nova sociedade e nem de uma nova ordem mundial.(Kleber Torres)


Ficha Técnica:
Título: Meteorango Kid - Herói Intergalático
Direção e roteiro: André Luiz Oliveira
Elenco: Nilda Spencer, Antonio Luiz Martins, Sônia Dias, Carlos Bastos e Milton Gaúcho
Música : Luiz Galvão
Direção de fotografia:  Vito Diniz,
Fotografia de cena: Cravo Neto, Mário
Produção: André Luiz Oliveira, Marcio Curi, Milton Oliveira
Data de lançamento: 1969
Brasil
P & B

Duração: 85 minutos

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