domingo, 20 de outubro de 2019

O pesadelo da ressurreição do fascismo




O velho Karl Marx considerava que a história se repete, a primeira vez como tragédia e na segunda, como farsa. Mas o filme Estou de Volta (Sono Tornato), uma produção italiana de 2018, dirigida por Luca Miniero, nocauteia esta tese e mostra concretamente,  que ela pode se repetir como comédia até de humor negro, como a da ideia de ressurreição do fascismo que ainda tem os seus adoradores e viúvas.
Tudo começa  após 70 anos da morte de Benito Amilcare  Andrea Mussolini, interpretado por Massimo Popolizio, que  ressurge em Roma, depois de passar através  de um portal que interligava magicamente o mundo dos vivos e dos mortos. O Duce, que se considerava o aeronauta do pensamento –os filósofos que se cuidem -, fica confuso e horrorizado ao ver a decadência do país que governou e se propõe a viajar pela Itália de hoje, onde nada funciona, nem mesmo os correios e nem os hospitais.
Mussolini também critica a miscigenação racial, a migração dos africanos e de gente de outros países europeus, o que o faz acreditar na necessidade de uma revolução e para isto, propõe  como lema para as mudanças: “vamos salvar a Itália juntos’. Também questiona os valores democráticos por considerar que o voto  não tem  nenhuma utilidade se o eleitor não sabe o que fazem de concreto os políticos eleitos.
Um repórter acredita que o misterioso personagem é um sósia do ex-ditador fascista e mesmo assim, o ajuda a começar na televisão como um comediante, que fazia questão de afirmar que era o verdadeiro Mussolini e que suas práticas e propostas  continuavam iguais às do tempo do fascismo.
A produtora Katia Bellini (Stefania Rocca) se entusiasma e pensa num show para este novo ator, o Mussolini Show e cria até uma conta de e-mail para o novo astro, que ganha pontos crescentes de audiência. Teatral, Mussolini faz caras e bocas na telinha, onde impõe silêncio e pausas planejadas, lembrando que: “todos vocês têm medo do silêncio. Se um rato entra em sua casa, você não chama um humorista, mas um dedetizador. Quando falo isto, vocês querem rir, por isso que em 1940 nós só produzíamos comédias. Depois de 70 anos, eu volto aqui e descubro que vocês continuam um povo analfabeto, conversando nas redes de sociais. Você estão sós, invejosos e cheios de rancor.”
Mussolini  faz duras criticas à sociedade de consumo, considerando que,  “estamos perdendo a batalha antes de começarmos a luta contra a pobreza entre jovens e idosos. Nós precisamos mais do que o whatsapp para nos dizer que estamos afundando .” O programa faz sucesso e consegue 33 pontos de audiência, alcançando 60% entre os jovens, o que leva Mussolini a todos os programas da emissora.
Dizendo que encontrou a Itália transformada numa Rodésia Setentrional, num Congo ou numa Nigéria, ele fala entre os planos para o futuro e defende a construção de um império: “voltei para ajustar o tiro! Pou!!!”. A tarefa para ele, é reconquistar a Itália e a memória nacional, desafiando os radicais de direita condescendentes com os guetos: “os políticos de direita têm medo de ser chamados direitistas e os de esquerda, de dizer coisas verdadeiras”, complementou.
Na sua metralhadora giratória, Mussolini se recusou até a falar do globalizado futebol italiano, onde os dirigentes são de Pequim, a bola indiana e os jogadores africanos. Quanto à política, ele sugere aos governantes que primeiro escutem os desejos do povo e depois façam obras e ações que atendam às suas expectativas.
A popularidade do fascista ressuscitado começa a ser questionada quando  ele é mostrado matando  um cão a tiros em um vídeo. Mussolini se defende dizendo que atirou, porque foi atacado e mordido pelo animal, mas não escapa uma agressão de defensores mascarados  dos animais. Outro golpe fatal na desconstrução deste personagem, foi Ariella Reggio (Nonna Lea), uma idosa com lapsos de memória, mas que reconheceu como o ditador assassino, que provocou a morte de seus pais, expulsando-o de sua casa.
Tudo termina quando o Duce, depois de um atentado, acaba reabilitado pelos italianos após ser perdoado pela dona do cachorro que matou, o que abre a porta para que avance com o seu carisma pelos caminhos, nem sempre retilíneos e para uma indefectível escalada ao poder, que às vezes corrompe absolutamente e por nos levar a muitos descaminhos. (Kleber Torres)

Ficha técnica

Título : Estou de volta (Sono tornato)
Direção: Luca Miniero
Roteiro: Luca Miniero e Nicola Guaglianone
Elenco: Massimo Popolizio , Ariella Reggio, Gioele Dix (Daniele Leonardi), Guglielmo Favilla (diretor de TV), Luca Avagliano (Gianni), Massimo De Lorenzo (Giorgio), Stefania Rocca (Katia Bellini), Frank Matano, Elenora Belcamino e Alessandro Cattelan
lançamento: 1 de fevereiro de 2018
Itália

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