sábado, 10 de janeiro de 2015

Nebraska








Velhice, decadência, pobreza, ambição e esperança, a última que morre, formam o eixo central de Nebraska, um filme que  nos mostra a saga de Woody Grant, um velho que acredita ingenuamente ter ganho um milhão de dólares numa jogada de marketing de uma empresa de alimentação, e que consegue o apoio de um dos filhos e da família para buscar o prêmio em Lincoln, que fica a cerca de 1,5 mil quilômetros e  a três estados de distância de Billings, no Montana onde reside.O filme também registra uma passagem em Howthorne, onde nasceu e onde estão as suas memórias e enterrada a história da família sem passado e ao mesmo tempo sem futuro.
O filme em preto e branco, começa mostrando um velho sem rumo numa estrada e sendo abordado por um policial e entregue aos cuidados dos seus familiares. Como não dirige mais, ele continua tentando a viagem a pé, o que causa preocupações para a  sua família e sensibiliza a um dos filhos, o David,  que pede licença do emprego numa empresa de produtos eletrônicos, para empreender essa maratona.
A trajetória entre Montana e Nebraska também permite visualizar como pano de fundo a crise social e econômica americana, com desemprego, precarização do trabalho e a falta de horizontes para pessoas desocupadas e sem acesso ao mercado de consumo. Assim, as pessoas dividem o tempo assistindo televisão em família ou indo para os bares.
A viagem permite ao mesmo tempo que  o pai e o filho  passem mais  tempo juntos e se descubram como pessoas em universos diferentes. A busca do prêmio representa a necessidade de um objetivo na vida mesmo para quem é idoso e ao mesmo tempo, permite uma revisão critica da vida, dos valores,  bem como dos parâmetros entre o sucesso e o fracasso medidos a partir de padrões meramente econômicos e financeiros impostos pela sociedade de consumo.
Na visita ao Monte Rushmore, em Keystone, na Dakota do Sul, onde estão esculpidos os rostos de quatro presidentes dos Estados Unidos, o velho Woody dá mostras da sua lucidez – que vinha sendo questionada pela mulher e pelos próprios filhos – ao comentar que a obra estava inacabada e incompleta. Ele observa que Jorge Washington, primeiro presidente era o único que parecia vestido e que a orelha de Abraão Lincoln não aparecia.
Woody também se reafirma como cidadão ao justificar que serviu ao seu pais – lutou na guerra da Coreia, paga os seus impostos e tem o direito de fazer o que quiser. Na parada em Hawthorne, há um reencontro entre irmãos, tios e sobrinhos, mas inicialmente na cidade ninguém o reconhece, não há lembranças suas nem mesmo na velha oficina onde foi sócio.No bar, onde  passa a beber em companhia do filho, Woody também descobre um velho amigo que  e dá vazão à notícia de que ficou milionário que se espalhou de imediato numa comunidade pequena e ávida por noticias.
A partir daí o tratamento das pessoas em relação ao anônimo Woody muda. A casa da família enche e ele passa a ser  tratado como milionário e celebridade, até mesmo num almoço com a mulher e o filho num restaurante onde é aplaudido por desconhecidos. Também um amigo e familiares, que o exploraram no passado, passam a querer participar da divisão da suposta fortuna cobrando alegadas dívidas inexistentes ou até sob ameaças e intimidação, mostrando a outra face da ambição, da ganância e da falta de escrúpulos.
O filme tem como pano de fundo um diálogo coerente entre os personagens e evidencia reflexões sobre a vida, a família, o presente e o futuro. Mas a questão fundamental do drama não se trata da pretensa fortuna de um milionário caduco, mas do tempo que resta para um idoso, das suas oportunidades e exepctativas.
Vale observar que a grande  maioria dos atores é formada por pessoas idosas, que integram uma grande família, ficando o destaque para a interpretação de Bruce Dern, que interpreta um homem rude, desajeitado e de poucas palavras monossilábicas. Ele espera no suposto prêmio não a riqueza, mas a melhoria econômica da família, ou seja, comprar uma pick-up e um compressor para pintar as coisas em casa, e com o resto fazer uma poupança. Com isso afastaria o temor da pobreza e do desamparo no final da sua vida.
O filme une a direção do competente Alexander Payne , que constrói uma narrativa bem humorada e ao mesmo tempo com densidade dramática  na medida certa. Cabe a Mark Orton a trilha sonora  essencialmente country e que se adéqua ao cenário de um movie road.
Outro destaque cabe a atriz June Squib, que interpreta Kate, a matriarca da família, uma velhota desbocada que fala pelos cotovelos, com uma postura autoritária e sem papas na língua, mas mostra uma visão critica da realidade a da história da família. Os atores Will Forte e Bob Odenkirk interpretam os filhos David e Ross, que acompanham o drama do pai beberrão, compreendendo os  problemas de um homem que não sabia dizer não a ninguém e o engodo  de ser milionário simplesmente por acreditar nas pessoas e na falsidade propaganda enganosa. (Kleber Torres - do livro Navio de Teseu e Outros Paradoxos)

Ficha técnica
Indicações: Oscar de melhor filme, Oscar de melhor ator, mais
Prêmios: Prêmio Independent Spirit de Melhor Primeiro Roteiro, Satellite Award de melhor atriz coadjuvante no cinema
Titulo Nebraska
Diretor: Alexander Payne
Elenco: Bruce Dern, Woody Grant; Will Forte, David Grant; June Squibb, Kate Grant; Bob Odenkirk, Ross Grant; Stacy Keach; Ed Pegram; Rance Howard, Uncle Ray; Devin Ratray,  Cole e Angela McEwan, Peg Nagy
Roteiro: Bob Nelson
Diretor de fotografia:         Phedon Papamichael

Música composta por: Mark Orton

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