A violência sem limites envolvendo questões como a
delinquência juvenil, gangues de rua e o poder do estado, com os seus problemas
econômicos, sociais e políticos numa sociedade futurista, mas atuando através
seus instrumentos de controle e repressão totalitários estão no cerne de
Laranja Mecânica (Clockwork Orange), um
filme anglo-americano de 1971, escrito, produzido e dirigido pelo
perfeccionista Stanley Kubrick, adaptado do romance distópico de Anthony
Burgess, com o mesmo nome e publicado uma década antes. O filme também utiliza
imagens violentas e perturbadoras
relacionadas com experiências comportamentalistas (behavioristas) e à
lavagem cerebral.
Laranja Mecânica mostra a vida do sociopata Alex DeLarge,
interpretado por Malcolm McDowell), como líder
carismático de uma quadrilha de delinqüentes juvenis, que não trabalha,
mas tem entre as suas preferências ouvir música clássica, praticando em
profusão os roubos, o estupro e violência pela violência, com o uso de um taco
de beisebol ou da sua inseparável bengala. A gang é integrada por Pete (Michael
Tarn), Georgie (James Marcus) e Dim (Warren Clarke) a quem ele chama de drugues
como resultado da fusão da palavra russa
друг, que é equivalente a amigo, brother ou camarada.
A história começa mostrando uma sequência de crimes
hediondos praticados pela quadrilha de Alex em uma Londres futurista e sombria.
Os quatro amigos depois de se intoxicarem com "leite-com" (leite com
drogas), se envolvem em mais uma noite de violência pela violência, ora espancando
um sem-teto idoso ou depois brigando com uma gangue rival liderada por
Billyboy.
Depois, o grupo rouba um carro, e vai até a casa do escritor Frank Alexander (Patrick
Magee), no fim de uma estrada vicinal, a quem agridem com violência deixando-o
inválido e para sempre em numa cadeira do rodas. Alex em seguida estupra a sua
mulher, que morre algum tempo depois em conseqüência da agressão, enquanto
canta Singin' in the Rain, tema musical de Cantando na Chuva, com Genny Kelly.
Alex é depois visitado por seu conselheiro correcional,
que o adverte sobre a sua saga de crimes e dos riscos de voltar à prisão. Logo
depois, ele vai a uma loja de discos onde encontra duas garotas, Sonietta e
Marty, a quem convida para uma bacanal no
apartamento da sua família. À noite, após
um desentendimento com os sócios descontentes com a sua liderança e
cobrando uma maior participação na partilha dos crimes, Alex se impõe mais uma
vez pela violência e o grupo parte para assaltar uma mansão.
Enquanto seus companheiros permanecem na porta da frente
atraindo a atenção da vitima, Alex invade o imóvel por um acesso lateral e mata
a mulher com uma estátua fálica, numa cena de apelo sexual e de violência
exacerbada. Ao pressentir a chegada da
polícia, Alex ainda tenta fugir, mas um dos parceiros o fere com garrafa de
leite jogada no seu rosto, o que o deixa atordoado e sangrando. Ao ser julgado
ele foi condenado a 14 anos de prisão.
A história é narrada em Nadsat, um calão que reúne um
conjunto de gírias dos adolescentes formadas por corruptelas de idiomas
eslavos, em especial do russo, misturado com o
inglês e o cockney, um dialeto dos moradores da zona leste de Londres.
Assim, a expressão Clockwork Orange, não implica apenas na tradução literal Laranja Mecânica, mas de um homem mecânico um
robô, uma vez que no Nadsat, orange significa duplamente laranja e homem.
Outro destaque do filme antológico e que concorreu a
quatro Oscars em 1972, ficando com o de melhor diretor para Stanley Kubrick e
conquistando dois Globos de Ouro do mesmo ano, sendo um para o diretor inglês e
o de melhor ator para Malcolm McDowell, fica para a rica trilha sonora, considerada um dos pontos
altos da Laranja Mecânica, reunindo uma ampla seleção de músicas clássicas e
composições com sintetizador Moog produzidas por Wendy Carlos.
Durante o
cumprimento de sua sentença, Alex encontra com o Ministro do Interior
vai à prisão em busca de cobaias para
uma terapia experimental visando a reabilitação de criminosos contumazes dentro
de duas semanas, através do tratamento não hortodoxo do Ludovico. Na tentativa
de reduzir a pena e ganhar as ruas Alex
se candidata a um processo de
lavagem cerebral com o uso de drogas sensibilizantes, enquanto o paciente
ficava amarrado em uma cadeira, com os olhos abertos – o equipamento é similar
aos usados nas cirurgias oftálmicas-,
assistindo a sessões continuas e intermináveis de cenas de violência em
campos de concentração, nos campos de batalha, em revoluções, ou meso através
de homicídios e estupros isolados, mas tendo como fundo musicas selecionadas
entre as preferidas do paciente.
Ao ser solto após o tratamento Ludovico, ele descobre que
seus bens foram confiscados pela polícia para ajudar a pagar a indenização das
suas vítimas, e que até seus pais tinham alugado o seu quarto visando melhorar
a sua renda familiar. A partir de então
Alex acaba tendo um encontro como todas as suas vitimas, que se
aproveitam para uma possível vingança depois de reconhecê-lo formalmente.
Assim, sem teto e sem rumo, ele vagueia pelo campo e
chega à casa do escritor Frank Alexander, que não o reconhece e o vê como uma vitima de um sistema autoritário e
como uma arma política para atacar o governo
ao qual se opõe. Ao ouvir Alex cantando no banheiro Singin' in the Rain
ele acaba reconhecendo o algoz, de quem se vinga tocando
Nona Sinfonia de Beethoven. Desesperado com a música que passou a odiar
e que ao ouvir se sentia mal, Alex acaba
se jogando pela janela do primeiro andar e acaba ferido, ao ser removido para
um hospital do governo, onde recebe um tratamento cinco estrelas, para
recuperação das fraturas e sendo submetido a um tratamento de reversão, que o
deixa completamente curado fechando o
ciclo dialético do filme.
Em sua essência, Laranja Mecânica aparece como uma
critica social e ao mesmo tempo como um alerta para a questão da violência,
seja na sua dimensão institucional ou não, exigindo mecanismos de controle
social e uma ação efetiva do estado. A história tem ainda como pano de fundo as
disputas entre conservadores e liberais,
que são iguais quando utilizam as
pessoas para os fins meramente políticos, embora nem sempre os meios
justifiquem tais ações ou propósitos.
O filme revela ainda ou fato preocupante: a própria
imoralidade e a amoralidade de Alex, um personagem acima do bem e do mal, indiferente
ao convívio social e à realidade do outro, como
reflexos de uma sociedade doente
e em crise, que aceita a corrupção, o
jeitinho, a impunidade e o uso do próprio sistema com objetivos eleitorais ou
demagógicos para preservação do poder e do status quo. O filme, assim como o
próprio livro, também é distópico no seu
alerta contra o totalitarismo e as facetas invisíveis de um estado gigantesco e
que emerge como um Leviatã hobbesiano. (Kleber Torres)
Ficha técnica
Titulo – Laranja Mecânica / Clokwork Orange
Direção : Stanley Kubric
Música : Wendy Carlos
Elenco: Malcolm McDowell — Alex DeLarge, Patrick Magee —
Sr. Alexander,
Warren Clarke — Dim, Adrienne Corri — Sra. Mary
Alexander, Miriam Karlin — Mulher-Gato, James Marcus — Georgie, Sheila Raynor —
Mãe, Anthony Sharp — Ministro do
Interior, Philip Stone — Pai, Pauline Taylor — a psiquiatra Dra. Taylor, Michael Tarn — Pete, Richard Connaught —
Billyboy, Líder de gangue
Ano : 1971
Origem : EUA – Inglaterra
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