Os 20 anos de ditadura que
prevaleceram após o golpe militar de 1964 não deixaram apenas um rastro de presos
políticos, dos quais pelo menos
1.843 foram torturados durante o período
de 1964 a 1985 e mais de 400 mortos, além de 130 milhões de brasileiros insatisfeitos e
frustrados. A repressão e a ditadura militar também geraram centenas de livros,
discos, filmes, além de jornais censurados ou liberados.
No cinema “Prá Frente Brasil” e “Eles
não usam Black Tie” aparecem como duas sagas
da ditadura com leituras diversas e enfrentando problemas com a censura. O
primeiro, disseca numa ficção calcada na realidade de Operação Bandeirante, com
a institucionalização da tortura e que
teve como um dos símbolos o delegado Fleury e a conquista do tricampeonato
mundial no período de Garrastazu Médici .
O segundo filme de Leon Hirsman, adaptado
a partir de uma peça de sucesso de Gianfancesco Guarnieri, também com excelente
desempenho como ator, fazendo uma radiografia ampla do movimento operário
brasileiro durante o regime de exceção. O filme tem fortes conotações políticas
e ideológicas, chegando na sua essência a ser panfletário, mas sem perder a sua
característica de uma obra de arte
universal ao transcender em termos de valores morais e do drama
existencialmente humano dos seus personagens.
Por
estas qualidades artísticas ele conquistou prêmios internacionais como o Leão
de Ouro, um prêmio especial do júri no Festival de Cannes, em 1981 e o Prêmio
Coral, no II Festival do Cinema Latino Americano, em Cuba e no Festival dos Três
Continentes, na França. Ainda em 1981, ele recebeu o prêmio Air France de
cinema como melhor filme, melhor diretor, melhor atriz e um prêmio especial
para Guarnieri. Dois anos depois, ele ainda
voltou a ser premiado no festival de Cartagena, na Colômbia.
Os
resultados exitosos do filme podem ser atribuídos a vários fatores a exemplo do
texto primoroso adaptado para o cinema, bem como a competente direção de Leon
Hirzman, que reuniu um elenco de primeiro time com Carlos lberto Ricelli
(Tião), Bete Mendes (Maria), Fernanda Montenegro (Romana), Gianfracesco Guarnieri (Otávio) e Milton
Gonçalves (Bráulio).
Em
síntese, o filme conta a história de uma família de operários convivendo com a
pobreza, a falta de recursos e seus dramas. O pai, Otavio é um líder operário
que havia passado três anos três anos na cadeia e que como torneiro mecânico de
uma indústria de grande porte, assume a luta em defesa de melhores salários e
por melhores condições de trabalho.
O
seu filho Tião, por seu turno, segue um roteiro inverso, preocupado com o
casamento imediato com Maria e se prestando a apontar colegas de trabalho, que
demitidos sumariamente facilitavam assim
a sua ascensão e escalada na empresa, com promoção para outros cargos. Numa
greve, Tião é desmascarado como dedo-duro e identificado como um fura greve.
Ele acaba perdendo o apoio do pai e da própria namorada, além do emprego que
abandona por falta de ambiente entre os colegas.
O
filme termina com uma passeata no enterro do líder operário Bráulio, morto em
um piquete diante da fábrica. Sua morte não foi acidental e acabou no filme
como uma bandeira de luta para fortalecer o movimento dos trabalhadores. Os diálogos secos e de
poucas palavras deram densidade ao filme, que em seu conjunto nos leva a um questionamento sobre o destino de um país depois de 15 anos
de ditadura – período em que Eles não usam Black Tie foi produzido-, com a
formação de uma geração apática e alienada, além de deixar um povo marcado pelo
medo e pela insegurança, o que se reflete na violência urbana, uma outra face
da mesma moeda.
Eles
não usam Black-Tie também mostra com nitidez como funcionava a repressão policial e uma batida num bairro operário, na sua abertura e a caça
sistemática de policiais fortemente armados com metralhadoras na captura de um
marginal pé de chulé, que acaba morto com rajadas de metralhadoras caindo
próximo a um grupo de trabalhadores indiferentes e que as vezes também são
vitimas dos assaltos, mas também não estavam indenes à ação repressiva e
coercitiva dos policiais.
Prá
Frente, Brasil (1982) foi historicamente um dos primeiros filmes a tratar da questão
da repressão durante e ditadura militar no Brasil, durante o período de 1964 a 1985 e por isso mesmo caiu nas malhas
da censura e só foi liberado para exibição
no ano seguinte à sua produção. O filme conta a história de Jofre (Reginaldo Farias), o homem
de classe média sequestrado e torturado por engano sob acusação de subversão,
um drama que afeta a ele, seus familiares e as pessoas que o cercam.
O
drama tem também como cenário o ano de 1970, na época dos anos de chumbo e do milagre
econômico. Assim, enquanto o país vibra com a conquista do tricampeonato mundial pela seleção brasileira de futebol,
embalado pela música ufanista Prá Frente, Brasil, presos políticos eram
torturados por agentes da repressão e até pessoas mesmo inocentes eram vítimas
da violência oficial.
Jofre
é preso ao dividir um táxi com um militante de esquerda, e acaba preso e
submetido a inúmeras sessões de tortura. O seu irmão Miguel (Antônio
Fagundes) e sua mulher Marta (Elizabeth
Savalla) tentam encontrá-lo através dos meios legais, mas se deparam com a
omissão da polícia em investigar o caso. Miguel fica sabendo da atuação de um
grupo de repressão política patrocinado por empresários e tenta inutilmente
ajudar ao irmão desaparecido.
Jofre
consegue fugir de seu cativeiro, mas é alcançado e morto pelos torturadores ao
som dos gols do jogo da final entre Brasil x Itália e da marchinha "Pra
frente, Brasil", que dá o nome ao filme. Vale salientar que é
justamente nas sequencias finais do
filme, ao partir do suspense para a ação, inclusive com cenas de tortura e de
vingança, que estão as melhores cenas de Prá Frente, Brasil, desde o cerco à
casa onde estão os familiares de Jofre, com tomadas tradicionais de faroestes,
e terminando em uma perseguição de carro numa autoestrada no estilo dos road-movies. (Kleber Torres)
Ficha Técnica :
Pra
frente, Brasil
Direção : Roberto Farias
Roteiro:
Roberto Farias
Elenco Reginaldo Farias, Natália do Valle.
Antônio Fagundes, Elizabeth Savalla, Carlos Zara, Cláudio Marzo, Neuza Amaral,
Ivan Cândido, Flávio Migliaccio e Milton Moraes
Ano : 1982
Duração
: 105 min
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