Instigante, assim pode ser definida a série "Cosmos: Mundos Possíveis", exibida pela National Geographic, que a transmite para milhões de pessoas em 172 países, inclusive o Brasil e em 43
idiomas, como uma janela aberta para a compreensão da vida e do universo. A
obra tem como base um projeto iniciado há 40 anos pelo astrônomo Carl Sagan (1934-1996), o qual
também narrava cada episódio da série anterior e nos legou um livro sobre o
tema, que ganha continuidade agora, numa produção coordenada pela sua
mulher, agora viúva, Ann Druyan.
A nova série revela, nesta
temporada curiosidades, inclusive biográficas e reflexões pertinentes sobre
o avanço da ciência e a história da humanidade, com incursões no campo da
filosofia e mesmo da política. Em termos didáticos, Cosmos: Mundos Possíveis compara a história do universo, criado há
cerca de 14 bilhões de anos, com um ano
terrestre – a terra tem estimados 4,5 bilhões de anos de existência – segundo
o calendário cósmico, uma escala de tempo elaborada por Sagan, com
o objetivo de resumir metaforicamente em um ano, com seus 12 meses e 365 dias,
toda a história do universo, desde o início do Big Bang aos dias atuais. Nesta
escala de tempo, cada segundo equivale a 500 anos terrestres.
Neste calendário, os dois últimos minutos do ano registram o acumulo de
todos os avanços conhecidos e realizados pelo homem ao longo da história da
humanidade. A série também nos faz refletir sobre o Big-bang e sobre os efeitos
da expansão do universo, que pode ser circular ou plano, a partir de uma visão a
partir da ótica da física quântica, a mesma que nos leva a pensar sobre a
hipótese de muitos mundos.
A interpretação de muitos
mundos (IMM) é um conceito da
mecânica quântica que propõe a existência de múltiplos "universos
paralelos", neste espaço, tudo oque possa acontecer já aconteceu em um cosmos paralelo ao nosso,
mas inacessível para nós humanos, mortais, finitos e formados por células e
partículas, as mesmas que foram e são o conteúdo do universo.
Assim, o que pode acontecer ou vai acontecer agora ou no futuro, já ocorreu
num mundo
paralelo, como numa espécie de superdeterminismo, em que cada evento foi previamente
determinado no início dos tempos, há justos 14 bilhões de anos, ou seja, no
primeiro momento do universo. O problema é que segundo esta teoria, nós estamos
sujeitos às mesmas leis que vigoram no universo quântico.
Numa análise mais fria deste processo, isso significa que
nós estamos viajando no automático, seguindo mecanicamente um movimento
iniciado há bilhões de anos, num universo em que ainda discutimos se o fóton e
a luz são partículas ou uma onda, uma questão que divide os cientistas nos
nossos dias, os quais buscam uma explicação sobre a origem do universo e da própria
vida.
A esse conceito,
Albert Einstein, pai da lei da relatividade, desenvolveu o conceito que
denominou de ação
assustadora à distância, ou seja, a interação contínua entre fótons distantes
entre si. Essa interação é possível graças ao entrelaçamento ou emaranhamento
quântico dessas partículas – se entrelaçadas, qualquer mudança experimentada
por uma delas afetará imediatamente a outra infinitamente.
Neste caso, se as
correlações são realmente definidas desde o momento do big-bang, a grande
explosão que deu origem ao universo ou aos universos, tudo está definido e foi
previamente pré-ordenado. Isso também justificaria o princípio da razão
suficiente, discutido por Leibniz, Kant e Schopenhauer para explicar que tudo o que acontece tem uma razão suficiente para ser assim e
não de outra forma, em outras palavras, tudo tem uma explicação precípua e suficiente.
Além de imagens poderosas com auxilio de telescópios e o
suporte da computação gráfica, a série também conta a história de filósofos, inventores e cientistas que pesquisaram sobre a luz,
fizeram estudos que permitiram o homem
viajar até a lua ou colocaram as suas vidas em risco ou salvar a humanidade da
fome.
Num destes cenários aparece Nikolai Ivanovich Vavilov, agrônomo e geneticista russo, conhecido por ter identificado os centros de
diversidade de plantas cultivadas, o primeiro cientista a compreender a
complexidade da biodiversidade e que dedicou sua vida ao estudo e melhoramento
do trigo, milho e outros grãos essenciais para a alimentação da população, selecionando
250 mil variedades de sementes, realizando grandes avanços em relação às
teorias de Charles Darwin e de Gregor
Mendel, sobre a hereditariedade.
Ele que idealizou e iniciou uma pesquisa
mundial para criar um banco mundial de sementes visando erradicar a fome no mundo, e tentava solucionar um
problema que matou mais de 100 milhões de pessoas na China, no século XIX; na
Irlanda, forçando a imigração de dois milhões de pessoas e mesmo no Brasil, durante
os idos de 1877/1879, numa seca que matou mais de 400 mil pessoas esfomeadas, o
que representava a metade da população do Nordeste, mas acabou preso e
torturado pelos asseclas de Stálin, que também promoveu o extermínio pela fome
de milhões de agricultores russos, com um projeto de coletivização de fazendas.
Vavilov acabou preso e submetido a tortura, que o deixaram
incapaciutado para andar, depois de exposto a mais de 1700 horas de
interrogatório excruciante em mais de 400 sessões de terror. Ele acabou morto
por inanição pelos seus algozes, um final trágico para quem sonhava eliminar a
fome do mundo.
Aos seus interrogadores, que o acusavam
de espionagem e de atividades antissoviéticas, em função do seu prestígio
internacional, ele confessou que seu único crime foi divergir profundamente de
uma opinião científica. Ele discordava de Trofim Lysenko, pai do Lysenkoismo,
um método também usado metaforicamente para descrever a manipulação ou a
distorção do processo científico, como uma maneira de se chegar a uma conclusão
pré-determinada em conformidade com um viés ideológico, geralmente
relacionada a objetivos políticos ou sociais, o que agradava ao todo poderoso
camarada Joseph Stálin.
Em tempo, o nome de Lysenko hoje é
lembrado como o de um exemplo de pseudocientista e Nicolai Ivanovich Vavilov,
deu seu nome ao principal centro de pesquisas agrícolas da Rússia e reconhecido
como um dos país da teoria biodiversidade. Seu nome ficou e perdura no panteão
da história. (Kleber Torres)
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